Ser Humano Dispara explosão evolutiva
Ricardo Bonalume Neto, para a Folha setembro de 2001

O ser humano é hoje a força mais poderosa agindo sobre a evolução dos seres vivos, como demonstra de maneira dramática o aumento da resistência de organismos causadores de doenças e pragas agrícolas.

E se a medicina e a agricultura não encontrarem meios de reduzir o ritmo desse processo evolutivo, o homem vai continuar às voltas com uma "corrida armamentista" contra essas pestes que vai causar prejuízos crescentes, já estimados hoje entre 33 bilhões a 50 bilhões de dólares só nos EUA.

Os fatos básicos já estão disponíveis há vários anos. Mas a idéia de que o homem precisa reduzir seu impacto na própria evolução biológica está sendo formulada agora por autores como Stephen Palumbi, da Universidade Harvard, autor de um artigo publicado hoje na revista "Science" (www.sciencemag.org).

O artigo resume o livro de Palumbi publicado este ano, "The Evolution Explosion: How Humans Cause Rapid Evolutionary Change", ou "A Explosão da Evolução: Como os Humanos Causam Mudança Evolutiva Rápida".

Um dos casos citados por ele é a evolução da resistência a drogas do vírus causador da Aids, o HIV.

"Alguns problemas são globais. Se um país tratar o HIV com apenas uma droga, isso poderia gerar um país inteiro cheio de vírus resistentes a essa droga, que poderiam se espalhar pelo mundo. Subestimar o potencial evolutivo desse vírus é talvez o erro mais sério, e evitável, que nós podemos fazer", disse Palumbi à Folha. "O HIV evoluiu tão rápido que em dois anos ele estará tão diferente de quando começou do que nós em relação aos chimpanzés."

São necessárias três coisas para que um organismo vivo evolua de acordo com o processo chamado de "seleção natural darwiniana", obra do naturalista inglês Charles Robert Darwin (1809-1882).

É preciso existir uma variação natural entre as características dos organismos, esses traços devem conferir alguma vantagem para o indivíduo e o traço deve ser hereditário, passível de ser transmitido de pai para filho.

Ao usar apenas uma droga contra um organismo, o homem está praticando uma forma de seleção, deixando vivos só os que têm resistência. Eles se multiplicam e viram maioria na população.

Praticamente todas as doenças causadas por bactérias desenvolveram resistência aos antibióticos usados contra elas, diz Palumbi. O resultado é uma corrida armamentista, em que a indústria tenta criar novos antibióticos, e as bactérias desenvolvem resistência.

Ele exemplifica com infecções por bactérias do gênero Staphylococcus, que eram tratadas com penicilina, antibiótico introduzido em 1943. Já em 1946 notou-se resistência à droga. Criou-se um "efeito cascata": depois
se usou meticilina, que foi substituída por vancomicina e assim por diante, à medida que surgia resistência.

"Em um hospital, esforços locais como seleção cíclica de antibióticos ou lavar as mãos podem reduzir a incidência de resistência. Mas países onde a disponibilidade de antibióticos nas farmácias é fácil têm índices maiores de resistência, e isso só pode ser resolvido no plano nacional", diz.

Ele sugere várias medidas para diminuir o ritmo da evolução induzida pelo ser humano. Em casos como o HIV, o certo é continuar usando várias drogas no tratamento. É preciso ter certeza de que a dosagem certa está sendo tomada pelo paciente. Rotação de herbicidas e uso de métodos não-químicos de controle reduzem o problema da resistência de ervas daninhas.

Deixar uma parte do campo sem plantas protegidas pode ajudar a diminuir a resistência de insetos. Esses chamados "refúgios" mantém na população de insetos as variedades não-resistentes, que se reproduzem com os mais resistentes e ajudam a "diluir" na população os genes de resistência.

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