A
utilidade do DNA-Lixo
Maggie Fox para a Reuters, agosto de 2003
Uma comparação do DNA humano com o de
outras 12 espécies animais mostra que compartilhamos mais semelhanças
genéticas do que se pensava e demonstra que as pessoas têm
mais parentesco com o rato do que com o gato.
A pesquisa também ajuda a reforçar a
tese de que o chamado DNA-lixo (ou "junk-DNA") é tudo
menos lixo. Embora sua utilidade continue um mistério, ele deve
realizar algo importante, porque se mantém praticamente idêntico
em muitas espécies.
O estudo também apóia algo que está
ficando cada vez mais claro -que os trechos do DNA chamados de genes
são só uma pequena parte da história.
A equipe de pesquisa do NHGRI (Instituto Nacional de
Pesquisa do Genoma Humano), nos EUA, comparou o mesmo trecho de DNA
em humanos, chimpanzés, babuínos, gatos, cães,
vacas, porcos, ratos, camundongos, galinhas, peixes de aquário
(paulistinhas) e dois outros que são considerados iguarias no
Japão, Fugu e Tetraodon.
Em humanos, esse trecho é uma região
genética muito estudada, que contém o gene CFTR. Quando
sofre uma mutação, o gene provoca fibrose cística.
"Ele fornece evidência definitiva de que
estamos mais próximos dos roedores do que dos carnívoros",
disse Eric Green, diretor científico do NHGRI e líder
do estudo. "Nossos dados realmente fecham o caso. Na sequência,
você pode encontrar mudanças no genoma que claramente ocorreram
tanto em humanos como em roedores, mas não ocorreram em outras
espécies."
As mudanças vêm em sequências repetitivas
de DNA que, até uns poucos anos atrás, eram creditadas
como lixo -trechos "inúteis" que de alguma maneira
se mantinham preservados. É muito difícil interpretar
o DNA. Seu longo código é construído com apenas
quatro nucleotídeos -os compostos conhecidos pelas abreviações
A, C, T e G.
Ler a longa sequência de quatro letras repetidas
em várias combinações está se mostrando
ainda mais difícil do que os cientistas imaginavam. De início,
eles pensavam que os genes -sequências que guiam a produção
das proteínas, tijolos com que se montam os corpos- seriam as
únicas partes funcionais da sequência.
Acontece que há sequências que controlam
os genes, e talvez façam até mais que isso. "Agora
parece que cerca de 5% de nosso genoma é funcionalmente importante",
diz Green.
"Apenas um terço disso codifica genes.
O que significa que dois terços do que é funcionalmente
importante não são DNA codificante." Green espera
descobrir a ação desses trechos não-codificantes
comparando os genomas de diferentes espécies.
"É realmente possível usar sequências
de genomas múltiplos, analisá-los todos de uma vez e tentar
encontrar a pequena porcentagem que é compartilhada por todos",
diz. "Acreditamos que isso vá se tornar um modo valioso
de encontrar as sequências que são muito importantes."
Por quê? Porque a natureza não pode jogar
fora DNA que é essencial para a sobrevivência. "Para
a evolução, trata-se de misturar coisas. Se a evolução
se agarrou a um pedaço de DNA, mesmo que repetitivo, está
nos dizendo algo. Onde foi que a evolução não achou
seguro modificar o genoma?" -pergunta.
A equipe de Green, que conta com pesquisadores da Universidade
Estadual da Pensilvânia, da Universidade de Washington e da Universidade
da Califórnia em Santa Cruz, todas nos EUA, vai examinar cem
regiões dos genomas das 13 espécies.
A região que contém o gene CFTR é
a primeira a ser analisada, e os resultados estão na edição
de hoje da revista britânica "Nature" (www.nature.com).