DNA:
Linguagem da Vida
"A vida inteligente em um planeta torna-se amadurecida
quando, pela primeira vez, compreende a razão da sua própria
existência"
"A partir do entendimento do que é o DNA
e de quais podem ser os seus usos, uma pessoa pode acompanhar as mais
modernas descobertas e os seus mais modernos usos, como é o Projeto
Genoma. Pode também saber que é possível determinar
a paternidade de uma criança pela amostra de uma gota de sangue
de onde se extrai o DNA de pai e filho. Como o DNA é a linguagem
da vida humana, vale a pena acompanhar o assunto".
Richard Dawkins
Professor de Biologia e Biólogo
Oxford, EUA
Quem forma o Clã dos Ácidos
As matérias vivas contêm quatro tipos
básicos de substância orgânica: proteínas,
glicídios, lipídios e ácidos nucléicos.
Todas as formas de vida possuem os chamados ácidos
nucléicos. Esses ácidos têm esse nome por terem
sido descobertos em primeiro lugar no núcleo das células.
Segundo o biólogo José Mariano Amabis, professor do Departamento
de Biologia do Instituto de Biociências da USP, em São
Paulo, os ácidos nucléicos são as maiores e as
mais importantes moléculas orgânicas. Essas moléculas
se encontram presentes em todas as formas de vida, desde vírus
até mamíferos, e não são uma particularidade
dos seres humanos.
Há dois tipos identificados de ácidos
nucléicos, que são:
O DNA (que significa, em inglês, DesoxirriboNucleic
Acid, ou ácido desoxirribonucléico). Ele tem esse nome
porque o açúcar que o forma é a desoxirribose.
E o RNA (que significa, em inglês, RiboNucleic Acid, ou ácido
ribonucléico). O nome vem do açúcar que o compõe,
que é a ribose.
Depois de terem desvendado boa parte dos mistérios e do mecanismo
desses ácidos, em particular o DNA, os cientistas puderam então
começar a entender o funcionamento da vida e da perpetuação
das espécies. A corrida às pesquisas começou a
atrair a curiosidade da população leiga quando foi dada
a informação de que, a partir do DNA, era possível
se fazer inclusive investigação de paternidade.
O que é o DNA
Para se ter uma idéia ou uma imagem do DNA,
basta pensar em duas fitas paralelas em forma de serpentina, ou helicoidais
(de dupla hélice). Essas fitas são formadas de filamentos,
já que as moléculas do DNA têm a forma filamentosa.
São filamentos paralelos devido à ponte, chamada ponte
de hidrogênio, que liga uma cadeia de filamentos à outra.
O DNA é então formado por uma base hidrogenada
e pelos nucleotídeos, que são a guanina, a citosina, a
adenosina e a timina.
Se tentarmos localizar o DNA, veremos, como diz Richard
Dawkins, que nosso DNA mora dentro de nosso corpo, e não se concentra
em uma parte específica do corpo, mas é distribuído
entre as células. Curiosamente, existem, diz Dawkins, cerca de
um milhão de bilhões de células constituindo um
corpo humano médio e, com algumas exceções, cada
uma dessas células contém uma cópia completa do
DNA daquele corpo.
O DNA é, dos ácidos nucléicos,
o que instiga mais a curiosidade, pelas suas características
e pelas suas várias funções.
Função do DNA
Uma vez que estamos falando em ácidos nucléicos,
portanto, ácidos encontrados nos núcleos das células,
convém saber que o núcleo representa justamente a central
de informações de uma célula. É como se
fosse uma torre de controle, de onde são distribuídas
as informações para que cada célula execute sua
tarefa.
Dawkins explica que as moléculas de DNA fazem
duas coisas importantes. Em primeiro lugar, elas se replicam, o que
significa que elas fazem cópias de si mesmas. Isso é facilmente
compreendido se imaginarmos um homem adulto, com um milhão de
bilhões de células, que começou, em sua versão
original, com uma única célula. Esta única célula
se dividiu em dois e, por meio de sucessivas divisões, chegou
a 4, a 8, a 16, a 32 e assim por diante, até chegar ao homem
adulto. Pode-se dizer que a função de replicar do DNA
é como se fosse a função de uma fábrica
modelo, com qualidade cem por cento, onde os planos do DNA são
copiados com fidelidade, praticamente sem erros, segundo Dawkins.
De acordo com esses planos do DNA, para que um corpo
seja ‘construído’, não basta que ele se duplique.
É preciso que alguma coisa mais aconteça. Assim, o DNA
faz uma supervisão indireta da fabricação de um
tipo diferente de molécula, que é a proteína.
Dawkins lembra que fazer proteínas talvez pareça
estar muito longe da fabricação de um corpo, mas, diz
ele, esta é a primeira pequena etapa nesta direção,
uma vez que as proteínas constituem grande parte da estrutura
de um corpo e, além disso, controlam os processos químicos
dentro da célula, ligando-os e desligando-os no momento e no
lugar certo. E essa movimentação toda dentro das células
é que leva uma primeira célula a vir a formar um bebê
e, mais tarde, um corpo adulto.
Usos e Descobertas sobre o DNA
A partir das pesquisas sobre o DNA e suas funções,
os cientistas podem hoje manipular os genes diretamente, sob formas
cada vez mais sofisticadas. É possível, por exemplo, extrair
o DNA de uma célula, fragmentar esse DNA, separar as partes contendo
alguns genes específicos e introduzir esses genes em outro organismo
vivo, segundo Amabis. É o que faz a Engenharia Genética,
identificando um gene, isolando-o e multiplicando-o a partir de diversos
organismos vivos.
De uma gota de sangue, de um fio de cabelo ou de um
osso se pode extrair o DNA.
A identificação genética de um
animal, por exemplo, pode ser feita hoje a partir de um simples segmento
de DNA encontrado em um osso. Esse segmento, de acordo com o relato
de Amabis, pode ser mil vezes multiplicado até se produzir uma
quantidade de DNA que seja suficiente para a identificação.
Por outro lado, uma espécie pode receber genes
de um ser vivo de outra espécie – isso vem sendo feito
há muito tempo com plantas – e, assim, essa espécie
é instruída a produzir substâncias novas, a partir
do gene recebido.
Os estudos do DNA já levaram a Engenharia Genética
à técnica da clonagem, inclusive em bactérias e
vírus.
Modernamente, o que mais vem chamando a atenção
do mundo é o Projeto Genoma. Este é um projeto internacional,
em que cientistas de várias partes do mundo juntaram esforços
e intercambiaram pesquisas com o objetivo de traçar o ‘mapa’
do organismo humano. O esperado é que se possa detectar, através
da decifração dos códigos do DNA, todas as possíveis
doenças que o homem possa ter e como mudar a orientação
daquele organismo, eliminando-as.
Outro uso do DNA, amplamente difundido, é em
várias questões da Medicina Legal.
O DNA na Medicina Legal
A justiça de Salomão
Conta a lenda bíblica que duas mulheres reclamavam
a posse de uma criança e o rei Salomão, um homem justo
e sábio, diante do impasse, disse às duas mulheres que
mandaria cortar a criança ao meio e daria a cada uma delas uma
parte. Assim que proferiu a sentença, uma das mulheres gritou
e implorou para que ele não fizesse isso, e que desse a criança
à outra mulher que dizia ser a mãe. Salomão, vendo
o gesto da mulher, mandou que a criança fosse entregue a ela,
pois somente uma mãe poderia ter semelhante atitude. Hoje, felizmente,
decisões judiciais não são baseadas mais apenas
na intuição salomônica, mas também nos testes
de laboratório que devem ser, conforme o caso, custeados pelo
Estado. Há vários usos combinados do DNA nas questões
que envolvem paternidade, crimes, violências sexuais, por exemplo.
Segundo o laboratório Diagenix, o exame de paternidade
é um dos recursos mais utilizados pela Justiça hoje, a
partir de técnicas que empregam o exame do DNA. Isso pode ser
feito em situações tais como:
bebê ainda está dentro do útero
(retira-se um pouco do líquido amniótico para teste).
O bebê já nascido, do qual se pode tirar uma amostra da
placenta ou uma amostra de sangue se o exame for realizado tempos depois
do parto.
O pai é vivo (em ambos os casos acima) – nesse caso, retira-se
uma amostra de sangue e faz-se a comparação do resultado
com resultado obtido do bebê.
O pai é falecido – nesse caso, pode-se extrair uma amostra
do DNA a partir da medula de um osso longo, como o fêmur, ou um
fio de cabelo, fazendo-se também a comparação.
Uma ressalva, segundo esse laboratório, é a de que o exame
a partir de unhas ou cabelos não é tão confiável,
pois são tecidos desvitalizados. Mesmo assim, as margens de acerto
nos exames de DNA são de praticamente 100%.
Para se confirmar a inocência ou a culpa de um acusado de crime
ou de violência sexual, desde que tendo meios de comparação
entre o material encontrado na vítima e o material encontrado
em um suspeito, exames de DNA também são realizados com
margem de acerto de 100% ou próxima disto.
Leitura Recomendada
Uma leitura em linguagem simples e acessível
ao público leigo é O Gene Egoísta, de Richard Dawkins,
da coleção O Homem e a Ciência, publicado pela Edusp.
Professor em Zoologia e biólogo, nascido em Oxford, EUA, Dawkins
apresenta uma forma de ver o ser humano, que é a de ‘máquinas
de sobrevivência’. Ele mostra como os genes – e, a
partir daí, todo o comportamento humano – são divididos
entre dois opostos, egoísmo e altruísmo, esta última
característica, conforme o autor, como um objetivo ainda a ser
alcançado. Dawkins lança um alerta, neste livro, quando
mostra que somos os únicos animais capazes de perceber os secretos
desígnios dos genes egoístas e nos rebelar contra eles.
Copyright © 2000 eHealth Latin America 26 de Setembro
de 2000