Perpetuação
Memética e Felicidade
João Carlos Holland de Barcellos
, Dezembro/2003
“O objetivo do genismo é a felicidade e, para alcança-la, o
único caminho é o da gene-perpetuação.” - Jocax
Quem toma contato com o genismo pela primeira vez estranha. Muitos
perguntam o porquê de focarmos os genes e não outra coisa qualquer.
Outros, de pronto, sugerem que poderíamos perpetuar memes (idéias) ao
invés de genes. Argumentam que o objetivo meme-perpetuativo seria tão
válido para a felicidade e o sentimento de imortalidade quanto a
gene-perpetuação. O objetivo deste ensaio é mostrar que a perpetuação
memética é apenas um dos caminhos da gene-perpetuação e que os
memes, quando desatrelados dos genes que os originaram, deixam de gerar
felicidade, podendo, até mesmo, vir a ser motivo de angústias.
Introdução
Se quisermos conhecer a nós mesmos, nossa essência, deveremos começar
pelas nossas origens e a nossa origem mais remota se encontra na origem
da vida. Podemos chamar a primeira molécula replicante, que deu origem
à toda a vida existente hoje, de “gene primordial”. Desde o
aparecimento deste “gene primordial”, até nossos dias, a evolução
dos organismos obedeceu a uma regra imutável: Organismos que não
transmitem seus genes à próxima geração tem suas características
suplantadas pelos que o fazem. Os organismos vivos hoje na Terra estão
num elo contínuo, ligados por milhões de ancestrais, até culminar no
gene primordial, a origem da vida. Todos os ancestrais, sem exceção,
deixaram descendentes. Então, todos os organismos, hoje, são formados
por genes que desde há quatro bilhões de anos tiveram sucesso em se
perpetuarem. É natural que os seres atuais devam ter também,
como característica própria, este potencial gene-perpetuativo.
Devemos ter sempre em mente que nossos genes não estão apenas em
nossos corpos, se fosse assim, uma mãe não teria o instinto (genético)
de arriscar a própria vida para salvar sua prole. Embora os
filhos tenham mais dos genes dos pais do que outros membros do grupo, o
compartilhamento genético entre seres da mesma espécie é sempre alto.
Isso explica porque o comportamento predatório evita seres da própria
espécie: Matar um semelhante é um ato que vai contra uma grande parte
dos próprios genes, que também estão compartilhados nele.
Diversidade e Memes
A evolução é feita através de mutações. As mutações são a fonte
geradora da diversidade genética. É de se esperar que em quatro bilhões
de anos muita diversidade tenha surgido. Existem estimativas apontando
para cerca de 100 milhões de espécies no planeta. E nós,
humanos, somos apenas uma delas. Cada espécie tem sua característica
peculiar de se adaptar ao ambiente e perpetuar seus genes. Nossa espécie
prima por possuir um cérebro muito grande em relação ao tamanho do
corpo. Este cérebro cresceu e se desenvolveu porque, como seres
sociais, houve uma grande pressão seletiva para isso,
principalmente a partir do aparecimento da linguagem falada. É no cérebro
que se armazena estratégias, conhecimentos, cultura em suma: memes.
Seleção Sexual
Acredito que a fala teve um papel muito importante, não apenas como um
meio rápido e eficaz na disseminação de memes, mas também como forma
de seleção sexual. A partir da fala homens e mulheres
(principalmente elas) teriam uma maneira eficaz de avaliar o parceiro, não
mais apenas pelo seu corpo, mas também por sua inteligência e seu modo
de pensar. E, na medida que a sociedade se desenvolvia, e se organizava,
maior a importância do cérebro em relação ao corpo.
Boas idéias logo são disseminadas e, quando o meme é realmente
útil, seu autor é prestigiado. Há um reconhecimento social por sua
criação. É uma forma de recompensar a quem é útil à sociedade. O
prestígio social, ou a fama, é muito benéfico aos genes,
abre-se muitas portas, conhece-se pessoas importantes, possibilita-se
favores e, principalmente, amplia-se a capacidade de conquista. O
autor de boas idéias, o artista, o escritor, o filósofo, o cientista,
o inventor fazem questão que seu nome, ou algo que identifique sua
pessoa, esteja associado à sua obra. Se não fosse assim seus genes não
poderiam auferir as vantagens, diretas e indiretas, decorrentes de sua
criação.
A associação de uma idéia ao criador é tão benéfica aos genes que
existem documentados muitos casos de roubos de idéias nas mais diversas
àreas do conhecimento. Além disso, mais do que a riqueza, uma
boa idéia pode gerar dividendos para os próprios genes, via
descendentes, mesmo após a morte do criador original da idéia.
Felicidade e memes
Se a perpetuação de memes gerasse felicidade por si mesma, isto é,
sem a necessidade de vincularmos nossos genes à criação. O criador do
meme não se importaria de divulgar o meme de forma anônima. Mas isso não
é o que realmente ocorre.
Podemos verificar isso através de uma comparação entre algumas outras
formas de felicidade. Vamos comparar, por exemplo, a perpetuação
memética com outras formas de prazer como, por exemplo, ganhar um
grande prêmio.
Quando se ganha um grande prêmio, numa loteria, por exemplo, não há
necessidade da sociedade saber que você foi o ganhador, muito pelo
contrário, muitos preferem o anonimato já que o dinheiro está
assegurado e, portanto, será benéfico à capacidade gene-perpetuativa
de qualquer maneira.
Quando se cria um meme há um certo prazer na criação em si, mas
este prazer é apenas um prenúncio, uma espécie de esperança do
sucesso do meme na sociedade. Se o meme não for aceito, ou for
rejeitado pela sociedade, então a alegria poderá se transformar em
tristeza. Por outro lado, se o meme for roubado, e divulgado por outra
pessoa, e o meme tiver sucesso então isso poderá causar transtornos
ainda piores para o seu verdadeiro criador: Ele não ficará feliz por
saber que seu meme obteve sucesso se seu nome não estiver vinculado à
sua criação. Será invadido por uma forte sensação de sofrimento e
injustiça. Isso acontece porque, desta forma, seus genes não irão
obter vantagens gene-perpetuativas com o meme.
Conclusão
A perpetuação memética provoca grande felicidade ao seu criador
quando o meme criado for vinculado ao criador e, além disso, quando se
pressente que o meme será útil à sociedade. Então, a perpetuação
memética é apenas uma das muitas formas de auxiliar nossos genes na
sua luta pela imortalidade, e não uma forma independente de se
conseguir felicidade.