O gene egoísta
Chico Prosdocimi, F. 2001-2


 

A teoria do gene egoísta é uma teoria científica genecêntrica que tenta explicar como ocorreu a evolução das moléculas em um nível pré-biótico e como essas moléculas evoluíram de modo a formar todos os seres vivos existentes hoje. Entretanto, essa teoria possui também um significado filosófico, já que ela tenta explicar o “problema profundo de nossa existência” e coloca-nos como sendo apenas máquinas de sobrevivência para nossos genes.          Richard Dawkins, o autor do livro “O gene egoísta”, é tido como o maior defensor atual das idéias evolucionistas e dizem que ele seria mais darwiniano que o próprio Darwin. Dawkins utiliza o darwinismo como uma arma imbatível com a qual ele ataca todas as idéias que vão contra sua visão materialista, reducionista e não mística da vida.           É importante notar que, ao contrário do que o nome da teoria parece sugerir, genes não têm nenhuma vontade de serem egoístas. Os genes não possuem nenhum valor moral e são simplesmente moléculas químicas formadas por DNA. Para entender o porquê do egoísmo é necessário entender a teoria e tentei aqui fazer um resumo de suas idéias principais. Recomendo também a leitura do livro, mesmo para o leigo, já que é bastante interessante e filosófico, podendo mudar o ponto de vista do leitor sobre todo o mundo e sobre o sentido da vida.

Evolução das moléculas

No mundo pré-biótico inicial, pode-se dizer que a primeira forma de seleção natural que ocorreu foi simplesmente uma seleção das moléculas mais estáveis e uma rejeição das mais instáveis.           Para que consideremos que a vida tenha surgido aqui na Terra temos que admitir o surgimento de uma molécula replicadora, independente de qual era a atmosfera primitiva existente e qual era a constituição química dessa molécula. Essa molécula teria surgido através da união espontânea de seus monômeros constituintes que estariam na sopa primordial e teria a capacidade extraordinária de criar cópias de si mesma.Logo que essa molécula surgiu ela deve ter espalhado suas cópias rapidamente pelos mares, até que o número de seus monômeros constituintes livres no meio foi ficando menor. Nessa situação, portanto, nós teríamos uma grande população de réplicas dessa molécula espalhadas pelos mares primitivos. Entretanto, devemos notar que o processo de replicação dessa molécula inicial não era perfeito e que erros eram cometidos e os erros eram cumulativos.Portanto, num certo momento, o caldo primitivo deve ter sido povoado por variedades de moléculas replicadoras diferentes. As moléculas que se replicavam mais rapidamente, que eram mais estáveis e que produziam menos cópias erradas acabaram por aumentar seu número em relação às outras, ou seja, elas estavam sendo selecionadas, estavam evoluindo!Na medida então, que os blocos de construção para esses replicadores foram ficando mais escassos, é provável que tenha havido uma competição entre essas moléculas. As cepas de moléculas que eram mais estáveis e se replicavam com maior velocidade e precisão sobreviviam, enquanto as outras cepas aos poucos se extinguiam. Portanto, estava ocorrendo uma verdadeira luta pela sobrevivência entre as linhagens de replicadores.O processo de melhoramento das moléculas era também cumulativo. Moléculas que eram capazes de aumentar sua estabilidade e de diminuir a de seus rivais eram mais adaptadas e mais eficientes. Algumas variedades talvez tenham “descoberto” uma forma de quebrar quimicamente as moléculas de linhagens “rivais”, de forma a destruí-la e a utilizar seus monômeros para fazer suas próprias cópias. Outras moléculas poderiam também ter descoberto como se proteger desses ataques, talvez formando uma parede de proteínas ou lípides ao redor de si. À partir desse momento, os replicadores começaram não só a existir, mas a constituir envoltórios protetores. Hoje, sabemos que os replicadores que sobreviveram foram aqueles que construíram as máquinas de sobrevivência mais eficazes para morarem.As primeiras máquinas de sobrevivência provavelmente não passaram de um revestimento protetor, mas à medida que os replicadores foram evoluindo, suas máquinas de sobrevivência foram tornando-se também maiores e mais complexas, sendo esse processo cumulativo e progressivo.Hoje, cerca de 4 bilhões de anos depois, qual seria o destino desses replicadores?“Com certeza eles não morreram pois são antigos mestres na arte da sobrevivência. (...) Mas não os procure flutuando livremente no mar. Eles abandonaram essa liberdade há muito tempo. Agora eles apinham-se em colônias imensas, vivendo com segurança dentro de robôs desajeitados gigantescos, murados do mundo exterior, comunicando-se com ele por meio de vias indiretas e tortuosas, manipulando-o por controle remoto. Eles estão em mim e em você. Eles nos criaram, corpo e mente. E sua preservação é a razão última de nossa existência. Transformaram-se, esses replicadores. Agora eles recebem o nome de genes e nós somos suas máquinas de sobrevivência.”

Richard Dawkins, O gene egoísta

Richard Dawkins define o gene como sendo uma parte qualquer do material cromossômico que é capaz de durar um número determinado de gerações de forma a servir como uma unidade de seleção natural. Como o próprio autor salienta, ele criou uma definição especial de gene que faz com que não possa deixar de estar correto.A imortalidade do gene está relacionada ao fato de que ele não tem maior probabilidade de morrer quando tem um milhão de anos do que quando tem apenas mil ou dez. O gene vai passando de corpo em corpo através das gerações, manipulando-os de acordo com sua própria maneira, “abandonando” esses corpos mortais na medida que eles vão ficando senis. Os indivíduos são passageiros mas os genes são para sempre. Eles não são destruídos pela recombinação, simplesmente trocam de parceiros e seguem em frente.Muitos genes bons podem cair, por vezes, em má companhia e compartilhar um corpo com um outro gene ruim, que seja letal e mate sua máquina de sobrevivência ainda na infância. Tal gene bom será então destruído, mas aquela é apenas uma das máquinas de sobrevivência que aquele gene está inserido e várias réplicas dele estão difundidas no pool gênico compartilhando outros corpos com outros genes bons e garantindo sua perpetuação.É muito provável que o envelhecimento seja simplesmente uma função do acúmulo de genes letais e semi-letais de efeito tardio, que conseguiram passar pela seleção natural porque seu efeito se manifesta depois da fase reprodutiva. E caso fosse decretada uma lei que impedisse os seres humanos de se reproduzirem antes de uma certa idade, por exemplo, 40 anos, em poucas gerações a expectativa de vida da população deveria aumentar.No que se refere a um gene, pode-se dizer que seus alelos são inimigos mortais, enquanto os outros genes apenas fazem parte do seu ambiente. O efeito de um gene depende do ambiente onde ele está inserido e, portanto, depende também dos outros genes, da temperatura, pressão e outros fatores. O conjunto de todos os genes em um corpo constitui um “background” genético que pode alterar os efeitos de qualquer gene em particular.Hoje em dia, portanto, o pool gênico é o novo caldo onde o um gene existe. A única alteração é que hoje em dia os genes existem cooperando com diferentes outros genes que vivem no pool de forma a construir uma máquina de sobrevivência mortal após a outra.

Os textos desse site podem ser reproduzidos total ou parcialmente, desde que o autor seja informado e receba os devidos créditos.
 ® Chico On Line. Prosdocimi, F. 2001-2.
 

Referências bibliográficas

1.      Dawkins, Richard. O gene egoísta. Ed. Itatiaia Ltda.

http://www.icb.ufmg.br/~franc/cool/evolucao/gene_egoista.htm

 

home : : voltar