O Genismo Hierarquizado
Jocax, Janeiro, 2009


Resumo: O genismo não estabelecia claramente uma ordem de prioridade entre seus pilares, e isto poderia causar conflitos. Este texto pretende hierarquizar as prioridades do genismo, e eliminar estes possíveis conflitos. Analisa também a evolução da consciência e faz uma comparação entre as fontes de felicidade no genismo e fora dele.

Palavras Chave: Genismo, MEC, Meta Ética Científica, Felicidade, Ética, Consciência, Evolução, máquina matrixiana de felicidade, VM2F.

Introdução

O Genismo é um meme que tem como objetivo a felicidade.

A felicidade não é simplesmente o prazer, mas a soma do prazer (e sofrimento) ponderado pela sua duração no tempo. O sofrimento diminui o valor da felicidade enquanto o prazer aumenta este valor [1].

Pela teoria da evolução, e o processo de seleção natural, sabemos que os seres vivos foram evoluídos *como* se tivessem o objetivo inconsciente e instintivo de perpetuarem seus genes, ou seja: de maximizarem sua “gene-perpetuação”.

Não existe nenhuma razão transcendental para os seres vivos agirem assim. Isso ocorre porque os genes que estão presentes hoje foram justamente aqueles que conseguiram adaptar seus portadores a preservá-los até o momento presente.

Os genes que não levaram seus portadores a perpetuá-los, isto é, não conseguiram fazer com que os organismos (fenótipos) que os portassem os levassem às próximas gerações, pereceram. Estes genes não mais se encontram entre nós. Somos todos, portanto, descendentes vivos do primeiro replicante (“o gene primordial”), que deu origem à vida a cerca de quatro bilhões de anos atrás, e que tiveram sucesso em sobreviver através dos tempos [2].

Por esta razão, a base da psicologia evolucionista, a ciência que estuda o comportamento e a estrutura social dos seres vivos, está alicerçada no paradigma “gene-perpetuativo”.

Mas como os genes fazem seus portadores (nós) agirmos “para” perpetuá-los?

Evolução e Consciência

Os genes induzem seus organismos a agirem no sentido “gene-perpetuativo” de muitas maneiras, Como através de:

1- mecanismos rígidos e biologicamente codificados.

Desta forma, por exemplo, uma planta não precisa pensar nem mesmo sentir que precisa voltar suas folhas ao Sol para receber luz. Mecanismos internos viram as folhas na direção da captação da luz solar. Mecanismos internos fazem este trabalho automaticamente. A frutificação ou o lançamento de sementes também é feito de maneira automática pela regulação genética da planta, sem nenhum auxilio de algum sistema nervoso.

2- instintos hiper primitivos.

Em seres dotados de sistema nervoso, existem mecanismos, codificados pelos genes através de algoritmos mentais (instintos), que induzem o organismo a se comportar e agir quase que mecanicamente, sem a necessidade de refletir ou pensar em sua ação. Tais algoritmos estão, em geral, localizados na base do cérebro, no sistema reptiliano. Por exemplo: o controle da respiração, a dilatação das pupilas no escuro, o eriçar dos pelos no frio etc. O aumento na capacidade de sobrevivência e reprodução são fatores que auxiliam na sobrevivência genética.

 

3- Instintos que geram desejos ou vontades.

Outros instintos (=algoritmos mentais geneticamente codificados para resolver determinado problema) não produzem diretamente uma ação no organismo, mas antes, impulsos, desejos e vontades, de forma que o próprio organismo, através de outros instintos ou pelo uso da razão ou da lógica, resolva a melhor forma de saciá-los.  Em geral tais algoritmos mentais, que geram desejos e sentimentos, estão alojados no sistema límbico cerebral. Exemplos: A raiva, o amor, o ciúmes etc.

4- mecanismos de recompensa.

Mecanismos de recompensa são estudados por uma área da ciência conhecida por behaviorismo. Estes mecanismos internos fazem com que o organismo aprenda, (com a utilização da memória), através da dor (ou do prazer) que uma ação é prejudicial aos genes (ou benéfica a eles).  Por exemplo: colocar a mão no fogo provoca dor, isto é um sinal, e uma forma de aprendizado, que colocar a mão no fogo é prejudicial aos genes. Comer substâncias doces é sentida como agradável porque, em geral, fornece energia ao corpo, e isso é, em geral, benéfico aos genes.

 

5- Regras Epigenéticas
 
“Regras Epigenéticas” são formas mais aperfeiçoadas de instintos. Basicamente são algoritmos mentais que não são utilizados enquanto não são necessários. Mas quando disparados e postos a ação podem ativar diversos outro mecanismos internos. Tais instintos não são disparados sem antes uma avaliação de sua necessidade em relação ao  ambiente. Por exemplo: receber um tapa no rosto pode disparar a raiva, ou pode ser um fenômeno de carinho em alguma cultura particular. O mesmo estímulo sensorial pode, ou não, ativar outros como a raiva ou a afeição, dependendo do contexto.

Estes mecanismos instintivos foram se desenvolvendo por seleção natural desde há milhares, se não mesmo por milhões de anos atrás. Entretanto, o ambiente pode mudar mais rapidamente que os genes se adaptarem a ele. Isso pode fazer com que fiquem  defasados em relação às mudanças ambientais, o que provoca o risco de morte ou da extinção da espécie. Por este motivo os genes, via seleção natural, foram flexibilizando cada vez mais as regras epigenéticas, o que levou ao surgimento do neocortex: a sede da razão.

Com esta nova camada cerebral humana, quase todos os estímulos, que outrora disparavam instintos que faziam o corpo agir imediatamente, agora já não fazem mais. As ações instintivas são bloqueadas, e antes de serem disparadas, passam por uma avaliação racional/ambiental: a consciência.

Uma das funções da consciência é, portanto, bloquear as ações instintivas, e avaliar qual a melhor resposta. Com uma resposta mais eficiente aos estímulos ambientais, a razão foi tomando, naturalmente, lugar dos instintos no controle das ações. Por esta razão conseguimos (às vezes) não bater em alguém quando esta pessoa pisa em nosso calo!

Claro, que os genes que criaram esta camada cerebral só sobreviveram porque esta estratégia foi mais eficiente na forma de perpetuar os genes do organismo. Por quê? Porque estamos aqui!
Se os genes que criaram a razão e a consciência tivessem tido menos eficácia em se perpetuar, nós não estaríamos aqui com todo este aparato consciente e racional na cabeça.

Com este novo aparato neurológico no cérebro surge um novo nível de gene-perpetuação:
 
6- absorção de memes.

Em decorrência da velocidade das mudanças ambientais e da incapacidade genética de criar algoritmos mentais específicos para cada situação ambiental diferente, os genes criaram uma estrutura mais flexível – o neocortex- capaz de bloquear os instintos e analisar, através da razão, a melhor solução antes de responder de imediato. A capacidade de armazenar memes na memória cerebral permitiu que o conhecimento pudesse ser utilizado sem ter que ser sempre reinventado quando surgisse a necessidade. Desde então a cultura e o cérebro avançaram e evoluíram bastante. Foi o que nos permitiu ir à lua, a criarmos remédios e nos tornarmos uma das espécies de maior sucesso evolutivo do planeta.

Prazer Ideológico

A capacidade de absorver memes permitiu o surgimento do prazer ideológico.
O Prazer ideológico é o prazer que se sente quando agimos em acordo com a ideologia (meme) que acreditamos ser verdadeira. Provavelmente ele se originou da necessidade de coesão em disputas territoriais e guerras tribais de nosso passado evolutivo. Por exemplo, se pertencemos a um time de futebol, a uma religião, a um clube, a uma cidade, país etc., então deveremos sentir prazer quando agirmos em beneficio do grupo ou da instituição a que pertencemos. Este prazer está alicerçado no fato de que pessoas próximas, que compartilham interesses comuns, devem também partilhar mais genes semelhantes, e assim, ajudá-las também é uma forma de ajudarmos nossos genes que, provavelmente, compartilhamos mais com elas do que com desconhecidos.

 

Genes e Felicidade

É importante notar que a utilização dos instintos, das regras epigenéticas, e da própria razão tiveram um “propósito” [4]: estes mecanismos evoluíram enquanto beneficiavam a gene-perpetuação. Mas os organismos não estão (a rigor, na verdade, nem os genes!), de fato, interessados na gene-perpetuação! Os organismos querem mesmo apenas mais e mais prazer e menos sofrimento e dor. Então toda utilização destes mecanismos internos cerebrais para a solução de problemas significa tão somente formas mais sofisticadas de se resolver problemas para aumentar o prazer e diminuir a dor pelo maior tempo possível, ou seja: São formas de se tentar maximizar a felicidade!

O que acontece é que os organismos dotados de sistema nervoso estão SEMPRE na fuga do sofrimento e na busca do prazer. O tempo todo. Como, simplificadamente, o prazer ponderado pelo tempo é a felicidade, então os organismos estão sempre buscando a felicidade. E os genes, por seu lado, estão sempre “querendo” sobreviver, se perpetuar.  Segue que em nosso passado evolutivo, ao menos, as formas de buscar felicidade deveriam ser as mesmas formas que conduziriam à gene-perpetuação. Ou seja: quanto mais felicidade conseguíssemos, mais perpetuação genética estaria sendo feita. E, portanto, temos assim a correlação lógico-evolutiva entre a busca da felicidade e perpetuação genética.     

Traição

Entretanto, os genes “não sabiam” que tal poder racional e capacidade de controle por parte de algo tão flexível como a consciência que criaram, e seus subsistemas neuronais associados, pudessem também se voltar contra eles próprios. A consciência, apesar de resolver com maestria problemas técnicos de forma a evitar a dor e conseguir prazer, também permitiu que memes nocivos à perpetuação genética (como, p ex., entre outros, o consumismo e o VM2F) e também à felicidade (como o budismo, o celibatarismo etc.) surgissem.  

Claro, ainda estamos em evolução, e a seleção natural também continua atuando, de forma que, no médio ou longo prazo, estes memes deverão encontrar barreiras, se não meméticas, ao menos barreiras genéticas contra a sua proliferação. Uma das formas dos genes se livrarem do VM2F, por exemplo, é fazendo com que o organismo tenha filho antes que o meme se instale em suas mentes, isto deve explicar o aumento do índice de gravidez na adolescência [3].

Hierarquização de Prioridades

Uma das coisas que o genismo sugere é a de que devemos seguir nossos genes. Mas o que significa isso?

Basicamente significa que devemos agir em acordo com o que os “genes querem”.
Uma forma dos genes sinalizarem o que querem é através de vontades e desejos. Por exemplo, se o organismo sente necessidade de água, mecanismos genéticos sinalizam com a sede. Se o organismo saciar a sede ele estará agindo de acordo com a vontade dos genes que criaram o mecanismo de sede. Mas podem existir vontades conflitantes também. Eu posso ter vontade de comer um doce, e, ao mesmo tempo, ter vontade de emagrecer e ser saudável. Como priorizar isso? E se uma ação gene-perpetuativa for antiética? 

A melhor maneira de resolver estes conflitos é através de uma hierarquia de prioridades. Assim, o que proponho é que:

1-A Meta Ética Cientifica deve ser a regra de maior valor hierárquico.
Dessa forma nem mesmo ações gene-perpetuativas são permitidas se por acaso infringirem a MEC.

2-O Caminho gene-perpetuativo deve ser priorizado em relação à satisfação de vontades e desejos.

3-A satisfação de vontades e desejos é uma forma de seguir os genes.

Através dessa hierarquia o “genismo-pragmático”, que se baseava mais no hedonismo como uma forma de maximização do prazer sem necessariamente uma contrapartida na gene perpetuação, agora, deixa de ser genisticamente compatível, se a ação for contra a gene-perpetuação.

 

Maximização da Felicidade

Com esta hierarquização de prioridades fica fácil perceber que a meta do genismo, por definição, em primeiro lugar é a maximização da felicidade, uma vez que a MEC tem a maximização da felicidade como postulado básico:
A Meta-Ética-Científica postula que uma ação é melhor, ou mais justa que outra quando o nível de felicidade geral proporcionada por ela, computada no maior período de tempo possível, for superior ao nível de felicidade proporcionada no mesmo período.” [5]

Felicidade entre Genistas e não Genistas

O genismo compatibiliza a meta cultural com a “meta biológica”. Dessa forma, os Genistas tem um prazer ideológico extra em saber que estão agindo de forma gene-perpetuativa, mesmo que esta ação também provoque um prazer naturalmente, que, em geral, é patrocinado pelos genes quando se segue o caminho gene-perpetuativo.

Por outro lado os não genistas, particularmente os que não estão interessados na gene-perpetuação, não irão seguir sempre um caminho gene-perpetuativo, e quase sempre um desvio desse caminho fará com que a pessoa sofra ou ao menos não tenha tanta felicidade quanto se o seguisse.

Um não genista, em condições naturais, tem duas opções:

1-Não segue nenhuma ideologia, religião ou filosofia de vida.

Neste caso a pessoa deve seguir o que lhe dá mais prazer, quero dizer, ela seguirá seus instintos e vontades visando à felicidade, o que é mais ou menos o pilar genistas que diz que devemos seguir os nossos genes. É mais ou menos como que voltar às nossas origens primitivas, mas dentro de um ambiente moderno. O que pode levar, com certa probabilidade, a uma trilha gene-perpetuativa, mas não necessariamente!

2-Segue alguma ideologia, religião ou filosofia de vida.

Como, por hipótese, estas filosofias ou ideologias não são o genismo, então a pessoa terá que restringir ou agir de acordo com uma ideologia que não vai a favor do genes, e por esta razão, deverá, em algum momento, reprimir seu genes, o que levará à perda de felicidade. Por exemplo: Algumas religiões promovem o sacrifício físico, como chibatadas, e rezas enfadonhas, para agradar a Deus. Mas estes sacrifícios diminuem o prazer físico, e, portanto, também a felicidade, embora possam dar um bom prazer ideológico.

Agora, um genista tem o prazer ideológico sem ter que sair da rota gene-perpetuativa. Dessa forma ele teria uma felicidade maior que um não genista sem ideologia, ou do que um não genista com ideologia, de forma que assim demonstramos que seguir o genismo produz mais felicidade do que não segui-lo.

O Caso Matrix

O caso matrixiano é um acaso extremamente artificial de maximização de felicidade individual ao custo de uma alienação máxima do mundo e do universo. Vejamos: 

Suponha que uma pessoa queira maximizar sua felicidade pessoal e entre num casulo matrixiano onde eletrodos são implantados em seu cérebro, e onde receberá alimentação intravenosa, de modo a passar o resto de sua vida nessa máquina maximizadora de felicidade.

A máquina por definição irá maximizar sua felicidade do modo máximo suportado por seu cérebro. Sua felicidade será maximizada como jamais seria no mundo real. Ele não perpetuara nenhum gene e ainda por cima consumirá muitos recursos do ambiente para poder permanecer nesta máquina por anos a fio.

Agora eu faço uma difícil pergunto ao leitor: Você entraria neta máquina matrixiana se lhe fosse oferecido gratuitamente?  E se não, por quê? 

Se a resposta for não é porque já existe em você uma centelha gene-perpetuativa agindo! J 

 

Referências

[1] A Fórmula da Felicidade
http://www.genismo.com/metatexto37.htm

[2] Genismo: Uma introdução
http://www.genismo.com/genismotexto1.htm

 [3] Gravidez na adolescência
http://www.brasilescola.com/biologia/gravidez-adolescencia.htm

[4] A Teleonomia: o “para” não significa propósito.
http://www.genismo.com/genismotexto3.htm#4

[5] Introdução à MEC
http://www.genismo.com/filosofia2.htm

 

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