Introdução ao Pensamento Lógico
Por: Eduardo Chaves
"-Consumidor:
'Um argumento é uma série interligada de afirmações destinada a
estabelecer uma proposição! Não basta dizer 'não, não é!'
-Argumentador:
'Sim, é!'
-Consumidor: 'Não, não é!!!'"
- Monty
Python, Live at the Hollywood Bowl
1.0
- Considerações Iniciais
Consideremos o
seguinte argumento, composto de um conjunto de cinco premissas que, em
seu conjunto, implicam uma conclusão não necessariamente obvia ah
primeira vista, mas que será explicitada em seguida:
Premissa 1: Um ser onisciente sabe como eliminar todo o mal do mundo;
Premissa 2: Um ser onipotente tem condições de eliminar todo o mal
do mundo;
Premissa 3: Um ser onibondoso tem vontade de eliminar todo o mal do
mundo;
Premissa 4: Um ser que não seja onisciente, onipotente e onibondoso não
é Deus;
Premissa 5: Existe mal no mundo.
Alguém pode ler todas essas afirmações e não perceber que elas
implicam uma conclusão necessária e, portanto inevitável, a saber,
Deus não existe. Para essa pessoa, se a gente demonstrar, passo a
passo, como as cinco premissas, em seu conjunto, implicam,
necessariamente, a conclusão, esta conclusão poderá parecer uma
descoberta da lógica -- mas na realidade não o terá sido, porque a
conclusão já esta embutida nas premissas: não é possível afirmar
a veracidade das cinco premissas e negar a veracidade da conclusão,
sem autocontradição.
Está, portanto provado, alem de qualquer duvida, que Deus não
existe? Do ponto de vista formal, puramente lógico, sim, sem duvida.
Do ponto de vista digamos, material, não-lógico, longe disso, porque
a veracidade de cada uma das cinco premissas pode ser questionada, e
se pelo menos uma das cinco premissas não ver verdadeira, a
veracidade da conclusão não se sustenta.
Agora, se alguém aceita a veracidade das cinco premissas, essa pessoa
terá, nesse argumento, uma prova da não-existencia de Deus, pois não
ha como se possa admitir a veracidade das cinco premissas e negar a
veracidade da conclusão de que Deus não existe -- a menos que a
pessoa não se importe com aceitar uma contradição (i.e., a menos
que ela não se importe com jogar fora a lógica, que resta no axioma
de que contradições não existem [este é um dos axiomas -- há dois
outros]).
A verdade ou falsidade das cinco premissas não é, neste caso, uma
questão lógica -- é uma questão extralógica. Não ha erro lógico
nenhum em se admitir, por exemplo, como Hume o fez em seus Diálogos
Acerca da Religião Natural, um Deus não muito ciente, ou não tão
poderoso -- ou, talvez, nem tão bom. Se se admite que Deus possa ser
algo menos do que onipotente, onisciente ou onibondoso, isto é, se não
se admite a veracidade da premissa 4, esse argumento deixa de se
constituir uma prova material -- mas continua a ser uma prova formal.
Concluindo esta parte, a lógica discute a validade ou invalidade de
argumentos. Os conceitos de validade e invalidade são conceitos
formais.
Um argumento é
valido apenas quando, SE as suas premissas são todas verdadeiras, não
ha como rejeitar a veracidade da conclusão (a menos que se cometa
autocontradição). Ou seja, para que um argumento seja formalmente
valido (i.e., valido do ponto de vista estritamente lógico), não é
necessário que suas premissas ou sua conclusão sejam verdadeiras:
basta que se possa demonstrar que, SE as premissas forem verdadeiras,
a conclusão também terá que, diante do exposto na parte 1 desta
mensagem, alguém pode questionar a utilidade da lógica. O que alguém
já disse, em relação ah estatística, aplica-se igualmente bem ah lógica.
A lógica e como um biquíni: o que ela cobre é muito pouco -- mas é
essencial.
Sem a lógica, não teríamos como distinguir entre um argumento
valido e um argumento invalido, ou seja, uma falácia. Sem a lógica,
não poderíamos criticar a forma de um argumento, mesmo quando
aceitamos suas premissas (e até mesmo sua conclusão). Sem a lógica
não saberíamos quando alguém é coerente ou incoerente, quando
estamos falando coisas com sentido ou nos contradizendo (e, portanto,
não dizendo nada).
Ilustro. Tomemos o seguinte argumento.
Premissa 1 - Todos os homens de bem são contrários ah política econômica
do governo
Premissa 2 - Todos os petistas são contrários à política econômica
do governo
Conclusão - Todos os homens de bem são petistas
Neste caso, vou pressupor (por amor ao argumento) que as duas
premissas sejam verdadeiras e que eu as reconheça como verdadeiras.
Se o argumento fosse formalmente (logicamente) valido, eu teria que
aceitar a conclusão como verdadeira. Se eu, embora aceite como
verdadeiras as duas premissas, não considero a conclusão verdadeira,
das duas uma:
OU eu disse adeus a lógica e aceitei uma autocontradição (na hipótese
de o argumento ser valido).
OU o argumento
não é formalmente valido (i.e. tem uma falha lógica em sua
estrutura e, portanto, é uma FALACIA).
No caso, não é difícil demonstrar que esse argumento não é valido
(ou seja, que é falacioso) -- embora não vá fazer isso aqui.
Compare o argumento anterior com o seguinte argumento:
Premissa 1 - Todos os que são contrários ah política econômica do
governo são homens de bem
Premissa 2 - Todos os petistas são contrários ah política econômica
do governo
Conclusão - Todos os petistas são homens de bem
Este argumento é formalmente valido (embora haja boas razoes para não
se aceitar a veracidade da Premissa 1) [Na verdade, a estrutura deste
argumento é exatamente a mesma do famoso argumento: Todos os homens são
mortais / Sócrates é homem / Logo, Sócrates é mortal]. O que isto
quer dizer é que, SE as premissas forem verdadeiras, seremos
forcados, pela lógica, a admitir a veracidade da conclusão. No caso
anterior este não era o caso.
A lógica é, portanto, essencial para nossa atividade de reflexão,
de argumentação, de comunicação. Sem lógica não ha nem reflexão,
nem argumentação, nem comunicação -- nem o bendito
"pensamento critico".
"Livre pensar" dizia se não me engano o Melar, "é só
pensar". é verdade. Quando estamos pensando livremente, deixando
nossas idéias (ou nosso fluxo de consciência) fluir, sem nos
preocupar com a verdade ou falsidade, coerência ou incoerência, do
que estamos pensando, podemos deixar a lógica de lado. Esse seria,
digamos, o "contexto da descoberta" ou o "contexto da gênese".
é aqui que a intuição opera, sem censura (digamos). é este o reino
da imaginação (em que produzimos obras de ficção, que não
descrevem, necessariamente, a realidade de forma verdadeira).
Quando, porem, vamos investigar se aquilo que pensamos (ou em que
acreditamos) é verdadeiro, ou justificado por evidencias ou
argumentos, precisamos da lógica. Mais do que isso: ela é
indispensável. Ela nos é indispensável até mesmo na comunicação
do dia-a-dia.
Se digo a você: "você é linda e você não é linda"
cometi uma contradição lógica -- ou seja, NAO DISSE NADA. Depois de
eu lhe dizer uma coisa dessas você não sabe se eu a acho linda ou se
eu não a acho linda. Em suma, não lhe comuniquei nada.
Alguns vão retrucar que às vezes dizemos coisas como "Esta
chovendo e não esta chovendo". Stricto sensu esta afirmação é
uma contradição que nada diz. O mais das vezes, porem entendemos o
que a pessoa esta querendo dizer, a saber, que esta chovendo um
pouquinho, mas não muito. O fato de entendermos isso não elimina,
porem, o fato de que a afirmação é autocontraditório e, stricto
sensu, nada informa.
Voltando ao que disse acima, essa área que a lógica cobre não é
grande, mas é essencial. Depois de termos certeza de que temos
argumentos formalmente validos, temos ainda que queimar as pestanas em
considerações não para determinar se as premissas que estamos
considerando são verdadeiras ou falsas. Aqui saímos da lógica e
entramos na teoria do conhecimento, ou epistemologia. ser,
necessariamente, não ha nada que nos obrigue a ser lógicos. não ha
nada que nos obrigue a não aceitar contradições. não ha nada que
nos obrigue a ser coerentes. Ser lógico é uma opção que se faz.
Alguém poderá dizer que é possível ser lógico em alguns momentos
e não em outros e sou forcado a admitir que sim. Na realidade, a
maior parte de nos é lógico em alguns momentos, ou em relação a
algumas questões, e não totalmente lógico (ou totalmente ilógico)
em outros momentos, ou em relação a outras questões.
Lidar com alguém que aspira a ser lógico e a evitar contradições
é relativamente fácil, porque se você mostra a ele que ele está se
contradizendo, ele Será forcado a se definir por um dos lados da
contradição ou a reformular seu pensamento.
Lidar com alguém que é lógico em alguns momentos e não (ou não
totalmente) lógico em outros é que é difícil -- porque não temos
como saber, em relação a uma determinada questão, se a pessoa está
pretendendo ser lógica ou não. Se eu imagino que ela está
pretendendo ser lógica, e lhe digo que ela está se contradizendo,
ela pode simplesmente me responder: "Dane-se você, sua lógica e
suas contradições". E se ela está se contradizendo, não sei
se ela, de fato, aceita "a" ou "não", ou se
rejeita a lógica.
Por isso, acho virtualmente impossível que alguém consiga se
comunicar com alguém que nem sequer tenta ser lógica. Na verdade, se
conseguimos, a maior parte do tempo, razoável sucesso em nos
comunicar uns com os outros, é porque compartilhamos estruturas lógicas
que são essenciais para a comunicação.
Se isso é verdade, posso aceitar que alguém que me agride
fisicamente, ou que meramente me xinga, não aceite a lógica -- mas não
consigo entender como alguém que tenta me convencer, por argumentos,
de que ele está certo e eu errado, possa, no mesmo ato, dizer que não
aceita a lógica. Se não se aceita a lógica, porque gastar tanto
latim com argumentos, com tentativas de convencer os outros de que o
ponto de vista da gente faz sentido ou está certo ou é superior as
alternativas? Por que educar, do ponto de vista cognitivo, as crianças?
(não estou dizendo que a educação deva se ocupar exclusivamente dos
aspectos cognitivos -- longe disso).
Para concluir. Como já disse, acredito que possamos, mesmo os que
pretendemos ser lógicos a maior parte do tempo, decidir algumas
coisas (às vezes até importantes) não com base na lógica, mas com
base no sentimento ou na intuição. Como o Toninho bem apontou,
quando nos apaixonamos, ou quando nos casamos, raramente o fazemos com
base em considerações lógicas. Se fossemos construir argumentos lógicos,
e, depois, analisar a veracidade de cada premissa, antes de nos
apaixonar, ou de nos casar, provavelmente nunca nos apaixonaríamos,
ou nos casaríamos. (Darwin, como já indicado aqui na lista, talvez
seja uma exceção). Alem disso, hoje em dia os especialistas em
administração estão admitindo que vários executivos muito bem
sucedidos tomam suas decisões mais importantes com base, não na lógica,
mas em intuição, "feeling", "huna”, etc.
Isto não é problema. O problema é confundir a lógica e o
sentimento, achar que não ha distinção entre eles, ou imaginar que
se possa viver sem um deles..
2.0 - Lógica:
Argumentos e Conceituação de Argumento
Um argumento é um conjunto de enunciados -- mas não um conjunto
qualquer de enunciados. Num argumento os enunciados têm que ter uma
certa relação entre si e é necessário que um deles seja
apresentado como uma tese, ou uma conclusão, e os demais como
justificativa da tese, ou premissas para a conclusão. Normalmente
argumentos são utilizados para provar ou disprovar algum enunciado ou
para convencer alguém da verdade ou da falsidade de um enunciado.
Assim sendo, o seguinte conjunto de enunciados não é, na realidade,
um
argumento:
1. Todos os metais se dilatam com o calor
2. Todas os meses há pelo menos quatro domingos
3. Logo, a UNICAMP é uma boa universidade.
Neste caso, embora todos os enunciados sejam (pelo menos à primeira
vista) verdadeiros, e embora eles se disponham numa forma geralmente
associada com a de um argumento (premissa 1, premissa 2, e conclusão,
precedida por “logo"), não temos um argumento porque os
enunciados não têm a menor relação entre si. Não devemos sequer
afirmar que temos um argumento inválido aqui, porque mesmo num
argumento inválido as premissas e a conclusão precisam ter uma certa
relação entre si.
Por outro lado, o seguinte é um argumento:
4. Todos os homens são mortais
5. Sócrates é homem
6. Logo, Sócrates é mortal.
Neste caso, temos um argumento válido, em que todas as premissas são
verdadeiras e a conclusão também -- ou pelo menos assim parecem à
primeira vista.
3. 0 - A Forma de um Argumento
Argumentos têm uma certa forma ou estrutura. O argumento constituído
pelo conjunto de enunciados (2) tem a seguinte forma:
7. Todos os x são y
8. z é x
9. Logo, z é y.
Imaginemos o seguinte argumento, que tem a mesma forma do argumento
constituído pelo conjunto de enunciados 4-6:
10. Todos os homens são analfabetos
11. Raquel de Queiroz é homem
12. Logo, Raquel de Queiroz é analfabeta.
Este argumento, diferentemente do argumento constituído pelos
enunciados 4-6, tem premissas e conclusão todas falsas. No entanto,
tem exatamente a mesma forma ou estrutura do argumento anterior (forma
explicitada nos enunciados 7-9). Se o argumento anterior (4-6) é válido
(e é), este (10-12) também é.
Quando dois ou mais argumentos têm a mesma forma, se um deles é válido,
todos os outros também são, e se um deles é inválido, todos os
outros também são. Como o argumento constituído pelos enunciados
4-6 é válido, e o argumento constituído pelos enunciados 10-12 tem
a mesma forma (7-9), este (1012) também é válido.
4.0 -
A Forma de um Argumento e a Verdade das Premissas
O último exemplo mostra que um argumento pode ser válido apesar de
todas as suas premissas e a sua conclusão serem falsas. Isso é
indicativo do fato de que a validade de um argumento não depende de
serem suas premissas e sua conclusão efetivamente verdadeiras. Mas se
esse é o caso, quando é um argumento válido?
5.0 -
Argumentos Válidos e Inválidos
Um argumento é válido quando, se todas as suas
premissas forem verdadeiras, a sua conclusão tiver que,
necessariamente, ser verdadeira (sob pena de autocontradição).
Considere os dois argumentos seguintes, constituídos,
respectivamente, pelos enunciados 13-15 e 16-18
Primeiro:
13. Se eu ganhar sozinho na Sena, fico milionário
14. Ganhei sozinho na Sena
15. Logo, fiquei milionário
Segundo:
16. Se eu ganhar sozinho na Sena, fico milionário
17. Não ganhei sozinho na Sena
18. Logo, não fiquei milionário
Esses dois argumentos é muito parecido. A forma do primeiro é:
19. Se p, q
20. p
21. Logo, q
A forma do segundo é:
22. Se p, q
23. não-p
24. Logo, não-q
O primeiro argumento é válido porque se as duas premissas forem
verdadeiras a conclusão tem que, necessariamente, ser verdadeira. Se
eu argumentar com 13 e 14, e concluir que não fiquei milionário,
estou me contradizendo.
O segundo argumento é inválido porque mesmo que as duas premissas
sejam verdadeiras a conclusão pode ser falsa (na hipótese, por
exemplo, de eu herdar uma fortuna enorme de uma tia rica).
6.0 - Falácias e Argumentos Sólidos ou Cogentes
Argumentos da forma representada pelos enunciados 22-24 são todos inválidos.
Dá-se o nome de falácia a um argumento inválido, mas não,
geralmente, a um argumento válido que possua premissas falsas.
A um argumento válido cujas premissas são toda verdadeira (e,
portanto, ·cuja conclusão também é verdadeira) dá-se o nome de um
argumento cogente ou sólido.
7.0 - Argumentos, Convicção e Persuasão
Um argumento cogente ou sólido deveria convencer a todos, pois é válido
e suas premissas são verdadeiras. Sua conclusão, portanto, segue das
premissas. Contudo, nem sempre isso acontece, porque as pessoas podem
não admitir que o argumento é cogente ou sólido. Podem admitir a
verdade de suas premissas e negar sua validade. Ou podem admitir sua
validade e negar a verdade de uma ou mais de suas premissas.
Um argumento válido, mas que tem uma conclusão patentemente
falsa pode ser “invertido" para mostrar que pelo menos
uma de suas premissas tem que ser falsa -- mesmo que não se saiba
qual.
Um argumento inválido (falácia), ou um argumento válido com
premissas
falsas, não deveria convencer ninguém. No entanto, muitas pessoas são
persuadidas por argumentos desse tipo. Por quê? Porque são ilógicas,
ou não percebem que o argumento é válido e que suas premissas são
verdadeiras.
8.0 - A questão da validade ou não de um argumento é
inteiramente lógica.
A questão da cogência ou solidez de um argumento é ao mesmo tempo lógica
(porque depende da sua validade) e epistemológica (porque depende e
suas premissas serem verdadeiras).
A questão da força persuasiva de um argumento é uma questão psicológica,
ou psicossocial, que extrapola a lógica.
9.0 - Lógica e
Linguagem
"... O aluno [precisa] entender
conceitos, proposições e argumentos como ferramentas para a apreensão
da realidade, vindo, assim, a compreendê-los, de forma muito mais
vital e funcional, através dos usos que possuem no pensamento e na
comunicação. A estrutura da linguagem seria então compreendida não
como convenção arbitrária, mas, sim, como uma maneira de refletir a
natureza da realidade como ela realmente é" - John
Wild, "Education and Human Society: A Realistic View", em
Modern Philosophies and Education, editado por Nelson B. Henry
(University of Chicago Press, Chicago, 1955), p.17.
Estudam-se as formas
de comunicação lingüística (em outras palavras, a linguagem), não
por pedantismo, mas porque a linguagem é o veículo através do qual
o pensamento se expressa.
É verdade que a correção da expressão lingüística não garante,
por si só, que o pensamento nela veiculado seja de boa qualidade.
Isso significa que é possível ter conteúdo sem qualidade em forma
correta. Contudo, no caso de pensamento e linguagem, dificilmente
ocorre o oposto: conteúdo de boa qualidade em forma inadequada. A
relação existente entre pensamento e linguagem é tão íntima que
uma linguagem inadequada dificilmente permite que se expresse um
pensamento claro e preciso. Na realidade, a inadequação lingüística
geralmente é sintomática de pensamento obscuro e impreciso, de
confusão nos conceitos e enunciados (entidades lógicas) que subjazem
aos termos e às orações (entidades lingüísticas).
Temos, como seres humanos, necessidade de comunicação constante com
nossos semelhantes. No caso do advogado, essa necessidade se torna um
imperativo de sucesso profissional. (ou, hoje em dia, no contexto
altamente competitivo em que vivemos, até mesmo de sobrevivência
profissional). Essa necessidade nos coloca diante de um imperativo: ou
aprendemos a pensar com clareza e precisão e a comunicar esse
pensamento de maneira correta, ou seremos deixados ou passados para trás
por aqueles que o sabem. Embora,possivelmente, sempre vá haver
semianalfabetos, ou mesmo analfabetos, que alcançam uma certa medida
de sucesso, o número destes tende a reduzir-se, no tipo de sociedade
em que vivemos, ao nível do estatisticamente desprezível.
Por isso, o estudo da linguagem e das formas de comunicação lingüística
é, geralmente, um importante primeiro passo para quem deseja ser bem
sucedido, pessoal e profissionalmente.
Mas não se trata apenas de aprender a redigir. O segundo passo é
estudar a estrutura lógica do discurso, isto é, os conceitos,
enunciados e argumentos que subjazem à nossa linguagem.
Usamos a linguagem para descrever, expressar sentimentos, fazer
pedidos e dar ordens, mas em determinados contextos usamos a linguagem
especialmente para argumentar, isto é, tentar convencer nossos
interlocutores acerca da verdade de algum enunciado em que acreditamos
ou que, por alguma razão, queremos defender. Nenhuma outra área
profissional usa tanto essa função argumentativa da linguagem
como a advocacia. Ou o advogado argumenta bem, ou ele está na profissão
errada.
O terceiro passo é estudar as técnicas de persuasão -- aquilo que
antigamente se chamava de retórica (e que agora,
surpreendentemente, volta a ser chamado pelo antigo nome). Sempre
causou espécie aos lógicos o fato de que um argumento válido pode não
ser persuasivo e que um argumento inválido (uma falácia) pode ser
extremamente persuasivo. Os lógicos têm dificuldade em entender isso
porque procuram ser absolutamente racionais. A maior parte das
pessoas, entretanto, se deixa levar pela emoção - e é aqui que a
retórica viceja (como os profissionais de marketing, publicidade e
propaganda, e os advogados criminalistas que alcançaram sucesso
persuadindo o juri, bem sabem).
O Ministério da Saúde usa a lógica. Ele adverte que o cigarro faz
mal à sua saúde. Os fabricantes de cigarro usam a retórica. Eles
convidam o telespectador a visitar o fascinante "Marlboro
Country". Todos nós sabemos qual dos dois persuade mais gente.
O advogado, especialmente (mas não exclusivamente) em suas argüições
orais, precisa estar familiarizado com a retórica. Se ele aparece
diante de um juri, então, a retórica é um imperativo.
10 - Considerações
Finais
Apenas como
curiosidade, o estudo da linguagem, da lógica e da retórica constituíam
a base da educação fundamental na Idade Média. Esses três domínios
do conhecimento eram chamados de Trivium, ao qual se acrescentava o
Quadrivium, que correspondia mais ou menos à nossa educação média,
e que se constituía do estudo de geometria, astronomia (i.e., ciências),
aritmética (matemática) e música (artes).
O Artigo termina com
a seguinte citação:
"A maior parte
das pessoas não pensa que o uso correto de inferências, hipóteses,
questionamento, e lógica em geral, tenha alguma relação com o que
temos que fazer na vida. Ora, em todo tipo de ação a questão é
como um homem sábio e bom pode se haver com integridade. Ou dizemos
que um homem sábio não deve perder tempo com questões difíceis, ou
pretendemos que, em se ocupando delas, não deve fazê-lo de maneira
completa, ou, então, devemos admitir que ele deve aprender a
solucionar esses problemas. Qual, afinal, é a finalidade do raciocínio?
É nos levar a aceitar a verdade, rejeitar a falsidade, e suspender o
juizo em casos de dúvida. Mas é suficiente saber qual é a sua
finalidade? Se você pensa que sim, pergunte-se se seria suficiente
apenas saber que existe dinheiro falso. Você deverá que admitir que
não, e reconhecer que seria preciso também saber distinguir o
dinheiro verdadeiro do falso. De igual forma, no raciocínio devemos
ser capazes de oferecer provas e distinguir entre o verdadeiro, o
falso e o duvidoso -- pelo menos isso é claro." Epiteto,
Discursos, Livro I, Capítulo 7, apud Richard
L. Purtill, Logical Thinking (Harper & Row, Publishers, New York,
1972), moto.
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