Por que a verdade?
Por: João Carlos Holland de Barcellos ( Março /2003 )

"Por que a verdade?"

Esta pergunta tem o sentido de "por que a busca pela verdade?" ou então "por que a verdade nos é tão cara, tão importante e também tão idolatrada?" Esta pergunta me surgiu apenas agora, digo recentemente, depois de muitos anos de idolatria a verdade e da minha própria busca por ela. Será que alguém já se fez essa pergunta?

Antes de nos aprofundarmos na questão é interessante definirmos o que é a verdade. A verdade é quase um conceito primitivo, como a definição de ponto ou de reta em geometria, um conceito que é utilizado para definir outros conceitos. Contudo, uma das definições que criei, e que não sei se é ou não original, é a seguinte:

 

"Verdade é toda informação compatível com a realidade ou com as de premissas das quais foi inferida."(jocax/2003)

Podemos perceber, primeiramente, que a verdade é uma informação a respeito de algo. Segundo, esta informação deveria ser compatível com a realidade, e não ir contra os fatos. Poderemos perguntar o que é realidade e o que é ser compatível e.... bom, nos estenderíamos para além do propósito deste ensaio.

Mas então, por que buscamos a verdade? Por que as Ciências , a Filosofia e tantas outras áreas do conhecimento se preocupam tanto com ela? Qual o real motivo ?

Uma das respostas possíveis seria : Por curiosidade. Ou seja, buscaríamos a verdade porque nos daria satisfação saber como são de fato as coisas. Nosso cérebro absorve informação e a verdade seria uma forma de tomarmos conhecimento do universo de uma maneira fidedigna para... saciar nossa curiosidade, aplacar um desejo , satisfazer uma vontade! A curiosidade é um ramo do prazer pela sabedoria. Ao adquirirmos conhecimento, que é, ou pensamos ser, verdadeiro somos recompensados com prazer.

 

Então buscamos a verdade por prazer ?

 

Mais do que isso. O prazer esta relacionado à felicidade. O que eu quero mostrar é que :

Buscamos a verdade para aumentar nossa felicidade !!!

 

É uma sentença ousada. Mas se analisarmos mais a fundo veremos que é verdadeira. A verdade é buscada porque sua informação pode ser utilizada para descobrirmos novas informações verdadeiras. Estas informações nos permitem conhecer a nós mesmos, conhecer a natureza e, eventualmente, alterá-la ou usá-la a nosso favor. A verdade é estável e confiável e a lógica nos ensina que conseqüências de premissas verdadeiras também devem ser verdadeiras. Por esta razão poderemos, eventualmente, fazer previsões verdadeiras se temos a verdade.

 

Mas por que fazer previsões? Por que conhecer a natureza ? Por que obter conhecimento?

 

Novamente, a razão última de fazermos tudo isso está na busca pela felicidade. Quando obtemos o conhecimento podemos fazer remédios, construir computadores, viajar pelo espaço, prever o clima, a duração do Sol etc.. E a razão de fazermos isso tudo é a felicidade. Queremos o prazer não o sofrimento. A verdade traz o conhecimento e com ele podemos obter mais felicidade. Não só a felicidade de obter o conhecimento em si mas, principalmente, as conseqüências que este conhecimento pode proporcionar.

 

Com a constatação de que a razão da busca pela verdade está na felicidade, somos levados a fazer a seguinte indagação:

 

É justificável adotarmos a "não verdade" se isto nos levar a um aumento da felicidade?

 

 

Se a razão da busca pela verdade está no aumento da felicidade a resposta a esta questão deverá ser afirmativa. E isto parece ter algumas implicações éticas.

 

A implicação mais relevante que posso perceber é a questão religiosa. Como ateu convicto sempre condenei as religiões por promoverem a ilusão, a utilizar a inverdade como forma de angariar adeptos. Mas o fato é que estas ilusões podem, em alguns casos, promover um aumento de felicidade. Então, o que acontece de importante, é que não poderemos mais condenar as religiões por estarem baseadas na falsidade e sim, talvez, pelo fato de elas realmente levarem, ou não, a um aumento da felicidade! O julgamento de uma doutrina , de uma ação ou de uma ética deverá ser tomado em relação à felicidade que ela poderá promover e não mais tendo como base apenas o critério da verdade.

 

Claro que muitos ainda vão preferir estar com a verdade mesmo que esta seja mais dolorosa do que a ilusão, mas não serão todos que pensarão dessa maneira. Na verdade, atualmente, a grande maioria da população parece não pensar assim.

 

Acredito que o grande problema desta abordagem é a contradição e suas conseqüências. Ao adotarmos o falso como um modo de ampliarmos nossa felicidade poderemos também contaminar nossas premissas verdadeiras. Isso ocorre porque ninguém adotará uma ilusão consciente de que ela seja falsa. O processo de se adotar uma ilusão ( como uma religião ) envolve uma grande dose de auto-engano. Isso implica que as mentiras, adotadas como verdadeiras, estarão no mesmo conjunto de verdades. Ao contaminarmos nosso conjunto verdade com premissas falsas poderemos concluir previsões enganosas e deturparmos o verdadeiro conhecimento. É algo extremamente perigoso. E talvez não valha mesmo a pena correr o risco pois a prejudicada poderá ser a própria felicidade.

 

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