Memes e Publicidade
Por: Melo Campos
Foi o zoologista
Richard Dawkins, de Oxford, que inventou o conceito de meme, no
seu livro «O Gene Egoísta» (The Selfish Gene, Oxford University
Press,1976). A «ciência dos memes» - a memética - procura
estender o paradigma da evolução Darwiniana à cultura.
A replicação dos memes é um
aspecto central da evolução da cultura de mesmo modo que a dos
genes o é para a evolução dos organismos. Um meme é uma
unidade de informação que é portadora de um comportamento que
influencia os acontecimentos de tal modo que mais cópias de si
mesmo são criadas noutras mentes. O mecanismo de desseminação
dos memes tem que ver com a imitação.O nosso comportamento
global é ao mesmo tempo instintivo (dirigido por genes) e
aprendido (dirigido por memes). Os memes que se desseminam mais
facilmente e se tornam dominantes não são necessariamente os
mais benéficos. São os «mais aptos» para a replicação.
Muitas vezes têm que ver com coisas como o perigo, a
alimentação e o sexo, o que faz com que accionem os nossos
«botões evolucionários» e sejamos forçados a prestar-lhes
atenção.
Os memes mais aptos podem, por isso,
acabar por nos distrair e afastar daquilo que na realidade
gostaríamos de fazer com a nossa vida. Tudo se passa de um modo
que parece resultar de uma Grande Conspiração secreta. Mas,
embora seja verdade que os senhores do marketing e da política
«conspiram» contra os nossos interesses, a maioria dos memes
prejudiciais parecem aparecer sem que haja propriamente
«culpados». São os memes mais virulentos que nos controlam a
todos, como se fossem entidades independentes de nós que se
aproveitam parasiticamente da nossa tendência inata para copiar
comportamentos.
E se um meme, «parasita» ou não,
é o resultado da evolução de uma comprida linhagem de
antepassados com sucesso, devemos esperar que seja bastante apto a
conseguir autoreplicar-se. É o caso da linguagem que evolui
porque tem ao mesmo tempo muita estabilidade e uma ligeira
possibilidade de mudança - os pré-requesitos para uma
evolução. Para já, os vírus dos computadores não evoluem mas,
no futuro, talvez comecem a fazê-lo também. E talvez alguns se
tornem úteis e «bons».
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Quem dominar a memética
- como os especialistas do marketing e da publicidade - pode
adquirir a capacidade de influenciar a «programação» da mente
dos outros ! E o estudo da memética pode ajudar-nos e a controlar
melhor a programação da nossa própria mente de modo a
conseguirmos gastar o nosso tempo naquilo que é mais importante
para nós, em vez de o gastarmos sob o domínio de memes
parasitas, contra o nosso próprio interesse.
O nosso comportamento global é ao
mesmo tempo instintivo (dirigido por genes) e aprendido (dirigido
por memes). Os memes que se desseminam mais facilmente e se tornam
dominantes não são necessariamente os mais benéficos. São os
«mais aptos» para a replicação. Muitas vezes têm que ver com
coisas como o perigo, a alimentação e o sexo, o que faz com que
accionem os nossos «botões evolucionários» e sejamos forçados
a prestar-lhes atenção.
Os memes mais aptos passam de cérebro
em cérebro dentro de comunidades e se a sua influência for
suficientemente estável pode até acabar por lhes determinar um
nome colectivo como Católicos, Marxistas, Portistas, Benfiquistas
...
Tipicamente, todas as
mentes estão profundamente infectadas porque são um ambiente
amigável para as ideias ou informações auto-replicáveis.
Replicamos frases e modos de agir e vestir: surgem as modas dos
Ió-iós, hula-ups, ténis de marca ou de pôr o boné com a aba
virada para a nuca e as músicas e frases dos anúncios da rádio
ou da TV ficam-nos «dentro da cabeça». Se não fosse assim, os
homens de negócio não gastariam tanto dinheiro a poluir o ar com
eles. Os memes mais aptos podem, na realidade, acabar por nos
distrair e afastar daquilo que na realidade gostaríamos de fazer
com a nossa vida.
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Os anúncios comerciais
são um modo de «plantar» memes nas pessoas. As técnicas podem
ser subtis ou óbvias mas são eficientes e são o produto de
muitos anos de investigação sobre métodos de influenciar o
comportamento humano:
-Se uma empregada desapertar o
segundo botão da camisa isso pode implicar um aumento no volume
de vendas.
-Se um vendedor nos oferece qualquer coisa, provoca em nós uma
sensação de obrigação. Sentimo-nos em dívida e «culpados»,
se não lhes comprarmos nada....
Estas técnicas
de manipulação aproveitam-se «cinicamente» dos nossos
melhores instintos e o que é mais perigoso é que podem
comprometer a nossa capacidade de os usar de um modo
saudável quando precisamos deles. Quando um vendedor nos
oferece alguma coisa, sentimo-nos devedores porque a
retribuição é um comportamento importante de que
depende a sobrevivência da nossa vida comunitária. Mas,
com a proliferação destas técnicas, podemos começar a
ficar paranóicos e achar que toda a gente que nos dá
qualquer coisa quer sempre algo em troca ! E isso pode
levar à erosão de um saudável espírito comunitário. |
Hoje em dia, a publicidade não
anuncia que um produto é bom nem fala sequer dos seus atributos.
A imagem que é transmitida tem normalmente apenas que ver com os
«clientes alvo» que se pretendem atingir e com os instintos
naturais que se querem manipular e absolutamente nada a ver com o
produto em si! Não são os produtos melhores que se vendem mais,
são os que têm uma melhor publicidade.
As melhores técnicas publicitárias
procuram desestabilizar o ouvinte criando-lhe uma qualquer
ansiedade que o põe mais frágil e passivo. O produto que se
oferece em seguida aparece associado a uma solução possível
para essa ansiedade. A ideia é destruir a nossa capacidade para
fazer juízos despertando a ansiedade associada à procura de
solução para questões profundas. Ficamos desligados das nossas
capacidades de decisão racionais, morais ou emotivas e das nossas
faculdades críticas e respondemos automática e inconscientemente
do modo pretendido. Muitas vezes, agimos exactamente de um modo
que ainda nos torna mais impotentes e fragilizados. E quanto menos
satisfeitos ficarmos com as nossas decisões mais facilmente
seremos manipulados.
O que é mais alarmante nesta era
dos «media» é que estas técnicas estão rapidamente a
transferir-se das lojas e dos ecrans de TV para quase todos os
outros aspectos da nosa experiência diária. Os políticos,
quando se apresentam ao eleitorado, acabam por não explicar muito
claramente o que pretendem fazer. Orientam o seu discurso também
para os temas que podem tornar os eleitores mais
«imuno-deficientes» e permeáveis à contaminação viral dos
slogans manipuladores. Também, por exemplo, quando entramos num
bar com o intuito de fazer novas amizades, nos acabamos por sentir
muitas vezes, e sem nos apercebermos disso, coagidos a agir de um
modo que se ajusta a essas técnicas publicitárias. Procuramos
encontrar os mais susceptíveis de contaminar e apresentamo-nos do
modo mais favorável à venda do nosso «produto». Acaba muitas
vezes por ser um jogo de faz-de-conta muito parecido com o dos
video-clips publicitários.
Estamos sob o
constante escrutínio de uma série de memes parasitas
muito persuasores e bem escondidos que se aproveitam dos
nossos instintos e os podem mesmo modificar.
Quanto melhor e mais
sofisticada for a manipulação, menos conscientes
estaremos de que nos estamos a deixar comandar por
«outros». Mesmo as pessoas mais desconfiadas acabam
sempre por ser afectadas e, por vezes, de um modo ainda
mais profundo e sofisticado e resistente à detecção.
Quanto pior nos sentirmos com nós-próprios ou com a
nossa vida mais facilmente somos apanhados. A melhor
táctica para podermos manter algum controlo sobre as
nossas acções parece ser a de não tentar resistir ao
irresistível mas tentarmos manter-nos conscientes da
manipulação.
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As técnicas de manipulação
aproveitam-se quase sempre de comportamentos psicológicos ou
sociais saudáveis. Como crianças, deixamos os nossos pais ter
autoridade sobre nós e necessitamos da sua aprovação. É uma
autoridade quase absoluta que é essencial para o nosso
desenvolvimento. Depois, essa autoridade é transferida para
professores ou padres e, mais tarde, como adultos, aprendemos a
tomar decisões por nós próprios. Mas às vezes os adultos
sentem-se como crianças: desorientados e a precisar de ajuda e
aprovação «paternal». E há certas pessoas que, só pelo seu
tom de voz, o seu modo de vestir, de agir e nos olhar, conseguem
fazer-nos comportar outra vez como crianças. Este tipo de
«regressão induzida» é muito usada nas técnicas de gestão,
venda e interrogação policial, que se baseiam exactamente em
métodos precisos e detalhados de provocar estados emocionais
infantis. As pessoas acabam por aceitar a transferência da
autoridade paternal para os técnicos que o estão a manipular,
ficando obedientes e à espera da sua aprovação.
«Muitas vezes consideramos uma
ideia mais verdadeira apenas porque é há qualquer coisa de muito
belo e divino no ritmo e na forma métrica do seu enunciado. Não
é divertido notar que os filósofos mais sérios, por mais
rigorosos que sejam na sua busca da certeza, citam frequentemente
as palavras dos poetas para dar às suas ideias mais força e
credibilidade ? E, no entanto, é mais perigoso para uma verdade
se um poeta concorda com ela do que se ele a contradiz! Porque,
como dizia Homero, «muitas mentiras contam os poetas»
FREDRICH NIETZSCHE em A Gaia
Ciência
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