A Nuvem Cinzenta
Joao Carlos Holland de Barcellos Nov/2007


Tente fazer um experimento mental: pense num cérebro. Pode ser um cérebro simulado, virtual se quiser, mas pode ser também um cérebro físico. Agora, imagine a expansão deste cérebro, como uma bexiga, um balão de borracha, inflando cada vez mais. Os neurônios sendo "espichados", seus dentritos e axônios sendo alongados cada vez mais... imagine que continuemos a INFLAR este cérebro até ele ficar realmente grande, como, por exemplo, quase do tamanho de um planeta. Cada neurônio de nosso "cérebro inflado" poderia estar a quilômetros um dos outros. Assim, abrimos (ou melhor, expandimos) a "caixa preta" cerebral e a transformamos em uma enorme "Nuvem Cinzenta".

Entretanto, nesse nosso cérebro inflado pela imaginação, a nossa “Nuvem cinza", ainda seria capaz de sentir e pensar, pois, em tese, no nosso experimento mental, o mantivemos "vivo" e pensante. Claro que as sinapses ocorreriam num ritmo muito mais lento, pois os sinais que antes passavam de um neurônio a outro em micro-segundos, agora deverão demorar minutos, talvez mesmo horas. Entretanto, o nosso cérebro hipotético inflado continuaria a pensar como antes, a não ser, claro, pelo seu ritmo ou taxa de sinapses, muito mais lentos.

Note que o que ocorre de importante na nossa "nuvem cinzenta" é a comunicação de sinais processados em cada neurônio, e, conforme o seu pequeno processamento interno, disparado a outros (ou não). Um neurônio recebe a informação de diversos outros (através de seus dentritos), e conforme seu próprio processamento interno, ele dispara (ou não) um sinal para outros neurônios (pelo seu axônio).

Cada neurônio individual não pode saber o que está acontecendo no cérebro todo. Cada neurônio não sabe o que o conjunto está pensando ou sentindo. Entretanto, sabemos que esse processamento todo, formado pelo conjunto do processamento unitário, mesmo que separados por quilômetros cada um, pode sentir e pensar. Essa é uma conclusão importante de nossa “Nuvem Cinzenta”.

Podemos também perceber que os três principais parâmetros da cognição de nossa "nuvem cinzenta" são: a quantidade dos “grânulos unitários”, formado por cada neurônio individual, a função objetivo de cada neurônio individual, e a configuração da rede, isto é, de como estes neurônios estão ligados entre si.

Sabemos que no caso da aprendizagem, por exemplo, novas ligações (sinapses) que antes não existiam, podem ser formadas, de forma que a configuração não precisa ser necessariamente estática. Hoje, sabemos também que novos neurônios são criados a partir de células tronco disponíveis no cérebro[1].Existe, portanto, certo grau de flexibilidade e também dinamismo.

A partir deste nosso modelo de "Nuvem Cinzenta", podemos inferir que muitas outras formas de organização, que mesmo que não sejam neuronais, possam, da mesma forma, pensar ou até sentir. Pensem, por exemplo, numa cidade, país ou planeta, onde cada ser humano faz o papel de um grânulo da rede (neurônio) e também se comunica com os outros. Essa rede de pessoas pode também formar uma "nuvem cinzenta", onde algo pode ocorrer mesmo que nenhum dos organismos individuais que compõem essa rede “saibam” disso. Um outro exemplo seria a Internet e seus computadores, ou a sociedade dos cupins, as formigas etc. Mas um exemplo particularmente interessante seria nosso material genético: o DNA e seus genes.

Os genes podem se comunicar com outros genes de duas maneiras:

1-Através da emissão de proteínas e enzimas que participam do controle celular: um gene pode assim ativar ou desativar outros genes que, por sua vez, podem gerar proteínas que afetarão outros genes dentro da mesma célula ou dentro do mesmo corpo. Seria uma comunicação endócrina.

2-Os genes emitem proteínas que formam os corpos e, estas proteínas, em forma de corpos, transmitem informações (memes) a outros corpos. Através dessa informação, estes corpos produzem hormônios e outras substâncias, que irão ativar (ou desativar) outros genes nesses corpos. Temos então uma comunicação inter-genes exógena. Esquematicamente, teríamos o seguinte esquema para a comunicação exógena inter-genes:

Genes --> Proteínas --> Corpos --> .... memes/ação ..... --> Corpos --> Hormônios/Proteínas --> Genes

Podemos também observar que a rede de comunicação dos genes, através dos diversos corpos que os abrigam, é similar a uma rede neural, onde os neurônios mais próximos apresentam maior grau de conectividade do que com aqueles mais afastados. Alem disso, novos genes podem ser criados quando, por exemplo, um organismo (macho) interage com um outro (fêmea) e os genes trocam informações diretamente produzindo um novo ser.
 
Assim, se não podemos afirmar que um neurônio "pense" ou que um gene "sinta" podemos, ao menos, conjecturar que o seu conjunto possa fazê-lo.

É importante observar que esta "Nuvem Cinzenta” genética também evolui. A pressão seletiva a que estão submetidos seus grânulos unitários (genes) fazem com que a "nuvem cinzenta" toda se adapte para sobreviver às intempéries ambientais e, quem sabe, num futuro longínquo, à morte do Sol.

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