O Glorioso Acidente
Essa entrevista cobre algumas das perguntas que me têm sido feitas com mais freqüência.
1. QUAL É O TEMA DE SEU LIVRO?
Ele é sobre a grande vedete - a grande estrela - da ciência neste final de século. A mente humana. Mente que é o resultado daquilo que o cérebro faz.
As novidades que têm sido descobertas sobre a mente lançam uma luz nova sobre várias e antigas questões. Todas tendo a ver com ...bem... com a natureza humana mesmo. Não quero soar muito bombástico mas é isso sim: meu livro é sobre coisas que a ciência tem a dizer sobre a natureza humana a partir do ponto de vista da mente. Mente que é um produto acidental do cérebro. Cérebro que é resultado do trabalho da seleção natural operando durante um período inimaginávelmente grande de tempo.
2. O QUÊ O MOTIVOU A ESCREVER?
Escrevi partindo de uma constatação: há um enorme apetite pelo mistério, pelo assombro, pelo inusitado, pelo não banal. A oferta de respostas é grande, mas sempre entrando pelo lado do misticismo, do esoterismo, outras vidas, espíritos, essas coisas. Então eu resolvi apresentar a ciência como alternativa. Como alternativa a esse "alternativo" que está aí. Para o leitor comum, para o público não especialista. Temas científicos apresentados de forma a provocar o interesse do leitor comum, a partir desse interesse que eventualmente será despertado é que faço minha aposta: a ciência pode ser a melhor forma que a gente tem para saciar essa nossa fome de entendimento.
3. QUE TEMAS CIENTÍFICOS "SOFISTICADOS" VOCÊ APRESENTA (SEM INTIMIDAR O LEITOR ?)
Deixa eu fazer uma afirmação provocativa para explicar o ponto de partida que usei. É provocativa mas rigorosa. Nenhum cientista discordaria dela: eu, você, tudo o que está vivo no mundo hoje, é o arquivo, o registro da sabedoria de vidas passadas. Todos nós somos fisicamente e mentalmente o resultado da competência de nossos ancestrais. Somos uma elite que sobrou de uma multidão de tentativas das quais só algumas deram certo. Somos - corpo e mente - o resultado das instruções que nosso DNA codificou em corpos e mentes que já morreram, mas que viveram o suficiente para copular e gerar crias. Milhões e milhões dos contemporâneos de nossos ancestrais falharam, nossos ancestrais não. A sabedoria que nossos antepassados tiveram foi essa: foram bons em fazer aparecer cópias do DNA deles em outros corpos, e como conseqüência moldaram outras mentes que também herdaram o que era necessário para continuar com a coisa. Essa é a finalidade da vida para a biologia; esse é o propósito da existência para o DNA: continuar existindo através de cópias que ele fabrica. Somos arquivos ambulantes.
Nosso DNA se provou muito bem sucedido porque ele está aqui. A imensidão do tempo geológico esculpiu o nosso DNA para sobreviver até o presente. Em cada estágio desse aprendizado, o DNA de cada espécie foi afiado, esculpido, filtrado pela seleção natural em uma enorme sucessão de ambientes diferentes, e aqui estamos. Somos o que sobrou.
Há trinta milhões de espécies distintas no mundo hoje. Há, portanto, trinta milhões de formas diferentes de passar o DNA a diante. Algumas no ar, outras no interior da Terra, outras na superfície, outras no mar ... O DNA de um camelo foi esculpido para possibilitar aos camelos viverem em ambientes desérticos. O DNA de um cactus também. O DNA de um tigre codifica para ele uma ordem assim: persiga a gazela. O de uma gazela escreve: fuja do tigre. Tudo o que é vivo é prisioneiro de seu passado evolucionário.
Bem, então as idéias científicas de que o livro trata são de várias categorias. Mas deixarei claro que não trato de químicas, neurônios, impulsos elétricos, sinapses ... Nada dessas coisas. Não é um livro que se preocupa com detalhes técnicos, mas com nuances de comportamento humano. Do que o cérebro faz conosco. Como nos tornamos o que somos via cérebro. Como o acidente da evolução que nos gerou, nos dotou de mecanismos para resolver certos conflitos mas não outros, e como nos vemos presos em compulsões das quais não conseguimos nos desvencilhar.
Então falo dos jogos engendrados pela mente desses macacos de cérebro grande que somos nós. De nossas procuras. Do entendimento que podemos ter sobre a vida e sobre nossos conflitos. Da ciência como a melhor forma de se responder às interrogações dessa mente mentirosa, ainda que não a todas as interrogações que possamos achar importantes.
4. COMO É ESSA COISA DO DNA ESTAR POR TRÁS DOS CONFLITOS HUMANOS?
Construindo corpos que são o veículo para a sua propagação. O DNA, o gene, constrói containers para sua própria replicação. Qual sabedoria que essas coisas têm de ter? Têm de ficar vivos o tempo suficiente para gerar crias. Têm de copular. Têm de ser bons em achar alimento. Têm de ser bons em não se deixar apanhar por predadores. Têm de saber evitar os perigos do mundo para poderem se dedicar ao imperativo da replicação do DNA. Têm de cuidar de suas crias de modo a que elas próprias cheguem à idade de copular, se não adeus DNA nas gerações seguintes.
A vida segundo essa concepção é totalmente centrada na replicação do gene (DNA), é isso o que a esgota completamente. É isso o que está na origem dos conflitos que vivemos, pois nossas mentes foram moldadas pelo processo para nos fazer ter as atitudes e os comportamentos que nos possibilitem propagar nosso genes. E quando chegamos ao ser humano, essa pura atitude biológica herdada de nosos primos orangotangos, de nossos quase irmãos chimpanzés, se transforma em outra coisa, por acidente, por acaso. E aqui estamos nós, presos em todo tipo de conflito. Todo o conflito humano em todos os níveis, do mais banal ao mais sofisticado, das manipulações mais domésticas aos grandes dramas sociais, tem origem num acidente da evolução que de repente nos tirou da rotina tranquila de animais que eram só instinto, e nos permitiu saber que podíamos saber.
5. O SER HUMANO É SÓ ISSO: UM VEÍCULO PARA O DNA PERSEGUIR SEUS PRÓPRIOS INTERESSES ESGOÍSTAS?
O ser humano é o resultado de um glorioso acidente que ocorreu com uma certa espécie cujo cérebro começou a crescer como um balão há partir de uns 2.5 milhões de anos atrás. Esse processo é que possibiltou o surgimento de linguagem e da conciência. À uns 100 mil anos já tínhamos consciência da morte; já enterrávamos nosso mortos em celebrações, rituais, já éramos sós e tínhamos medo.
É claro que o ser humano é diferente. Mas diferente em quê? É uma aura, um espírito que o torna diferente?
O ser humano é diferente porque algo aconteceu por acaso: um cérebro grande do qual brotou uma mente. Insisto nesse "por acaso" para enfatizar o fato de que a seleção natural - o principal mecanismo através do qual opera a evolução - é um mecanismo burro, que não olha à frente e não prevê, não pretende chegar a nada em particular. Ele atua em cima daquilo que as circunstâncias da história do planeta Terra colocam à sua frente. Por exemplo, se ela veste as calças depois percebe que esqueceu a cueca, ela coloca cueca por cima das calças. Não volta atrás. A mente surgiu como resultado de um processo insípido assim.
Então o livro aproveita esse pretexto da mente casual para explorar várias idéias científicas modernas e interessantes, em linguagem simples e acessível. Sempre a partir do personagem central. Desse artefato cuja arquitetura é a coisa mais fantástica que há - o cérebro. E a partir disso uma série de idéias, em vários contextos, vão emergindo. Ao fundo sempre comportamentos humanos, não à luz da psicologia tradicional, mas à luz da ciência; da matemática através da Teoria dos Jogos, de certas simulações em computador, da psicologia evolucionária que é um ramo novo, novíssimo, da Psicologia que tem a idéia de Darwin - não a de Freud - como fonte de inspiração.
6. O GLORIOSO ACIDENTE DO TÍTULO ENTÃO O QUE É EXATAMENTE?
É o acidente evolucionário que fez com que há uns dois milhões de anos uma certa espécie de chimpanzé tenha se desviado de sua linhagem original, seus cérebros começado a crescer, crescer, e tenha levado a espécies quase humanas - hominídeos - que um dia, provavelmente à uns 200 mil anos atrás, já tinham cérebros do tamanho dos que temos hoje. Numa piscadela de dois milhões e pouco de anos, o cérebro mais que triplicou de tamanho. Mas, mais importante: aquele cérebro falava, era consciente, pensava, olhava para o céu e buscava explicações. Por que a criança morreu? Porque o tigre pegou meu amigo? Tinha medo de trovão. Inventava deuses e se esforçava para agradá-los.
O cérebro humano, a mente interrogadora, buscadora de respostas. Obcecada por respostas, mas sempre vulnerável ao engano. Ao auto engano.
A mente que teve de aprender a desenvolver estratégias de comportamento - jogos - porque o próprio processo que a gerou exigia que ela fosse jogadora competente para poder continuar existindo. Exigia que ela se especializasse em adivinhar o que os outros estariam pensando. Sim, porque nessa época, o homem já era gregário - já vivia em bandos. E vida em grupo implica em conflito gerado pela necessidade de dividir a caça, o trabalho, de ter acesso a fêmeas. Conflitos sim, porque a lógica que gerou a essas mentes é egoísta, mas o animal que acabava de surgir tinha de aprender a colaborar, se não podia conviver em grupo e sem convivência não deixava crias. Esse é o nosso tema. Esse animal - egoísta por instinto, altruísta por interesse - é que é nosso tema. E ele é o cérebro dele. Os jogos que ele joga - entre nações, na família, na vida - é o tema. A perspectiva é a da ciência. Darwin, o processo da seleção natural, o jogo do gene. Nada esotérico ou espiritual, ou místico ou misterioso. Mas sim o processo natural mesmo. Processo no qual não prestamos quase atenção mas que pode nos dar um tipo de resposta que nenhum outro pode.
7. JOGO? MENTIRAS DA MENTE ?
Olha só: tudo o que é vivo é produto da evolução. O processo pelo qual as coisas vivas se tornaram o que são. Mudança ao longo da imensidão do tempo. Mudaram comandadas por um mecanismo chamado seleção natural: o processo automático através do qual as coisa vivas que geram mais descendentes acabam enchendo o mundo. As outras somem. As menos competentes na arte de deixar descendentes somem.
Essa é a história que Darwin nos contou. Tudo começou a uns 4 bilhões de anos com alguma molécula que tinha uma capacidade estranha: servia de molde para sua própria replicação. Como a sopa que, ao esfriar, gruda no fundo da panela e adquire a forma desse fundo. Essa molécula era o DNA (na verdade um tipo e molécula parecida). Não se sabe ao certo como ela surgiu, mas quando a primeira surgiu - uma só - nos mares e oceanos da Terra que se resfriara, ela começou a usar o material que estava em volta para fazer cópias de si mesma. Cópias porém, nunca são perfeitas, e dos erros de cópias acabaram surgindo vários tipos diferentes de moléculas com a mesma propriedades moléculas autoreplicadoras.
A obsessão autoreplicadora gerou as várias espécies de seres vivos. Para vencer na competição pela sobrevivência, contra os vários tipos de entidades autoreplicadoras que se formaram, o DNA de cada uma - o gene - construiu armaduras, couraças protetoras, para garantir acesso aos meios necessários à sua replicação. Máquinas de sobrevivência. O gene só quer sobreviver. Ele construiu corpos de plantas e animais de tudo o que é vivo, olhos, rins, pulmões e também, construiu cérebros, quando algumas daquelas máquinas de sobrevivência, ao contrário das plantas, precisaram se mover. São uma espécie de computador central usado para controlar movimento rápido. Somos produtos de um processo que, na base, tem o egoísmo do gene como motor. Genes fazem o que fazem conosco para garantir sua propria sobrevivência. Nós somos máquinas de sobrevivência dos genes. O DNA nos constrói para que ele possa se replicar. Olhos, cérebros, mente tudo é para isso.
Voce vê manifestações desse egoísmo atávico no comportamento animal o tempo todo: o filhote que tenta enganar a mãe fingindo que tem mais fome do que tem. O pássaro recém-nascido que empurra para fora do ninho os ovos onde estão seus irmãos que ainda não nasceram.O outro que grita alto fingindo ter fome e atrai predadores ao ninho, fazendo chantagem com os pais como quem diz: me traga mais alimento, se não algum predador acabará sendo atraído por meus gritos. É a mesma estratégia do seqüestrador que ameaça explodir o avião com ele próprio a bordo.
Repare o feto no útero. Desculpe o exemplo que contraria um pouco essa idéia romântica sobre maternidade. O feto tenta, via placenta, sugar mais sangue e nutrientes do que seria justo. Claro que o feto é egoísta: ele tem 100 % de interesse genético nele mesmo. A mãe só tem 50% de seus genes nele, portanto entre ela e o feto em situação de conflito a seleção natural faz com que ela se livre do feto. Só raramente é o " feto que aborta a mãe". Quando o feto consegue abortar a mãe ela morre. A natureza (apelido da seleção natural) encontrou um equilíbrio para isso, pois se o feto vencer a mãe ela acaba morrendo e ele morre junto (diabetes, eclampsia são doenças da gravidez motivadas pelo egoísmo do feto). A mãe propõe ao feto um acordo assim: "não queira tirar de mim mais nutrientes ou sangue do que eu posso te dar; colabore que eu levo a gravidez até o fim e cuido de você até que você próprio possa cuidar da replicação de seus genes". A mãe desenvolveu, então, mecanismos que expulsam naturalmente fetos ambiciosos demais; quando o feto "vence" a tendência é ambos perderem.
8. O JOGO DA EXISTÊNCIA ENTÃO SE RESUME A...?
Pois é... claro que não é só isso. É daí que surgem o Frankenstein e o Einstein de meu subtítulo. Graças ao Glorioso Acidente nos tornamos capazes de reagir à ditadura do gene. Temos um conjunto de hábitos coletivos a que chamamos de cultura, que é - ela própria - claro, um produto de nossas mentes como tudo mais. O fato é que desde uns dez mil anos atrás quando a agricultura começou, começamos a criar um enredo novo para nós próprios dentro do enredo original que vínhamos vivendo. O gene egoísta não era mais o ditador absoluto; havia algo mais.
Nosso problema é que estamos sempre presos a essa tensão entre o impulso do gene egoísta e a necessidade do contrato social, da convivência em grupo. Essa tensão se manifesta de várias maneiras e em muitas dimensões, desde os conflitos mais banais do dia a dia até as nossa grandes interrogações existenciais.
Percorro essas coisas todas no livro. Comportamento do dia a dia, política doméstica, relações pais e filhos, homem e mulher ... Resolvi usar idéias científicas pouco badaladas (mas cada vez mais badaladas) para contar essa história.
Certos conflitos da mente vistos não pelo lado da Psicologia tradicional, mas pelo lado da Matemática. Matemática?
É. Mas uma matemática que não assusta ninguém. Uma certa Teoria dos Jogos, que trata de tomadas de decisão em situações de conflito, quando os interesses são opostos. Isso é uma conseqüência do fato de sermos humanos. É conseqüência do egoísmo do gene. A origem disso é o processo que formou o cérebro em primeiro lugar. Por que será que não agimos sempre racionalmente?
Historinha um
Bem banal. Uma mulher tem duas filhas. Sempre que volta do trabalho ela traz um pedaço de bolo para dividir entre as duas. Mas, por mais que se esforce para dividir o pedaço por igual, uma sempre acha que ela favoreceu mais a outra: "o pedaço dela é maior ". A mãe sofre porque se vê presa na chantagem emocional das filhas. Ela ama as duas igualmente mas não consegue resolver o conflito psicológico, a manipulação psicológica que as duas armam. Sai deprimida. A solução racional, óbvia, existe mas ela não vê. Qual é essa solução? Basta mandar uma da filhas dividir o bolo e a outra fazer a escolha primeiro. Acabou o problema. Mas a mãe não vê, e não aje assim. Acaba no psicanalista, na terapia familiar ou pior ainda: cai nas garras da auto ajuda. Não vê que seu problema é falso. Não consegue ser fria. O conflito é gerado dentro de sua própria cabeça. É ela contra ela mesma ...
Historinha dois
Indiana Jones e A Última Cruzada. Lembra desse filme? Indiana Jones e seu pai (Sean Connery) disputam com os nazistas quem chega primeiro ao local onde está o Santo Graal, o cálice da vida eterna. O pai está ferido e sangra um bocado. Se não encontrarem logo o tal cálice, ele morre. Chegam finalmente ao local, mas por azar o nazistão chefe chegara lá segundos antes e está diante de vários cálices. Apenas um contém o líquido da vida eterna. Ele pára e pensa. Alta tensão. Indiana atrás, com o pai agonizando, o nazistão acaba escolhendo um lindo cálice de ouro cravejado de brilhantes, bebe e morre aquela morte cinematográfica, consequência das escolhas erradas. Aí vem Indiana. O pai morrendo. Ele tem de escolher o cálice certo. Opta por um tosco cálice de madeira leva aos lábios e... escolheu certo! Que bom. Em seguida leva o cálice ao pai, que bebe e se cura de seus ferimentos. Tudo bem.
Tudo bem?
Lamento mas Indiana se comportou irracionalmente. Sua estratégia foi errada. Nessa situação havia um escolha racional a fazer e ele não fez. Ele devia ter dado o cálice primeiro ao pai - não devia ter provado o conteúdo antes. Se o cálice fosse o certo, tudo bem, o pai estaria vivo e ele também. Mas se o cálice fosse o errado, o pai morreria, mas ele ficaria vivo. Do jeito que fez - bebendo primeiro - se tivesse escolhido errado ele morreria e o pai também, como conseqüência de seus ferimentos.
Bem, mas suponha que Indiana Jones conheça as idéias da Teoria dos Jogos e decida agir racionalmente; vamos rebobinar a fita. Indiana chega, escolhe o cálice, dá ao pai primeiro e o pai morre.
Indina pensaria: "Bem, fiz o racional, fiz o certo. De nada adiantaria eu ter bebido primeiro porque agora nós dois estaríamos mortos". Tudo bem?
Tudo bem nada. Indiana é humano, e por alguma razão psicológica começa a se culpar pela morte do pai. Vive atormentado pela culpa. Não consegue tirar de sua mente a imagem do velho estrebuchando. Emagrece. Entra em depressão. Fica impotente. Faz tratamento psicanalítico para se livrar da culpa. Não vemos mais seus filmes (heróis deprimidos não têm o menor charme!) Tudo por quê? Porque se comportou racionalmente. Porque fez o que racionalmente deveria fazer! Qual a lição disso? O racional só não resolve. Há sempre componentes de outro nível que têm de entrar em consideração quando há seres huamanos em jogo. É daí que surge um aspecto do Frankenstein do meu título.
Historinha três
A guerra fria. Fim da segunda Guerra em 1945. Os Estados Unidos de posse de uma arma que ninguém mais têm e que os possibilita dominar o mundo. A Russia,líder do outro bloco de poder formado no pós-guerra não tem essa arma mas está trabalhando para tê-la. Ninguém sabe o que ela fará quando tiver. O mundo correrá perigo.
Estou pensando com a cabeça paranóica da guerra fria no final dos anos quarenta. Qual a coisa racional a fazer?
Bertrand Russel um filósofo, lógico matemático, pacifista, preso por se opor à primeira guerra, que perdeu sua cátedra em Cambridge por causa dessa oposição, vem a público e diz: Vamos propor que a Russia se submeta a nós - bloco de cá - e façamos um governo mundial. Se ela não topar vamos bombardeá-la antes que ela possa nos bombardear. Isso é o lógico a fazer: Tão lógico como a demonstração de um teorema em Matemática.
Depois ele negou que tivesse dito isso, mas disse. A lógica é meio sinistra, não acha? Há considerações éticas que nos atormentam. Há um vozinha interior que nos diz: "isso pode ser o lógico, mas não está certo". Há outras considerações a levar em conta. Não do domínio da lógica, mas do domínio do humano. Como resolver isso?
9. O QUE TEM A VER O DNA COM NOSSOS CONFLITOS HUMANOS?
O gene é egoísta mas colabora para formar organismos. O que tem isso que ver com jogo? Um dos insights mais interessantes da ciência recente tem que ver com isso. Vou explicar através de uma outra historinha.
Historinha 4
Eu e você cometemos um crime juntos. A polícia prende nós dois, mas não têm provas. A opinião pública pressiona. A única maneira de a polícia resolver a coisa é um acusar o outro. Ela mantém nós dois incomunicáveis em celas separadas e propõe o seguinte a cada um separadamente:
1. Se eu denunciar você, mas você não me denunciar, eu saio livre e você fica preso.
2. Se eu não denunciar você, mas você me denuncia, é o contrário: você sai e eu fico preso.
3. Se ninguém denunciar ninguém, os dois saem livres.
4. Se os dois se dedurarem mutuamente, os dois ficam presos.
Os dois começam a pensar. Estão isolados lembrem-se, não se comunicam. Eu penso:" bem eu vou me calar, mas, e se ele me dedurar? Eu fico e ele sai? Não; eu vou dedurá-lo, pois se ele se calar eu saio de qualquer maneira, mas se ele me dedurar - aquele safado - então eu ficaria preso de qualquer maneira". Você por seu lado pensa exatamente igual. O racional para os dois é trair. Os dois traem e os dois ficam presos.
A decisão racional leva à pior consequência: a prisão de ambos.
Há muitas situaçõs assim: O interesse individual leva à pior conseqüência para todos se todo mundo agir assim "racionalmente"
Eu pulo a roleta do metro á noite. (eu penso: "não tem ninguém olhando, porque não?").
Eu não deixo o carro em casa apesar da campanha para diminuir o engarrafamento ("já que todo mundo está deixando eu não preciso deixar"). Se todos pensam como eu o resultado é todo mundo respirando fumaça preso no engarrafamento. Eu não chamo a companhia de eletricidade quando falta luz no bairro... "o vizinho vai chamar, com certeza". Mas o vizinho pensa igual e... todo mundo fica no escuro.
Imposto? Todo mundo paga,não vão precisar do meu.. Mas se todo mundo pensa assim....
O que fazer? Exortar ? Bobagem. Apelar para o senso ético, mora? Pode esquecer. Nosso egoísmo têm origem na economia da alma humana.
Racionalmente a coisa é simples. Se eu só encontro com você uma vez o racional é trair em situações de dilemas como esses.
Como resolver isso?
No fim da década de 70 um cientista social resolveu promover um torneio de programas de computador que simulavam os dois prisioneiros do meu primeiro exemplo. Só que em vez de jogar uma vez só decidindo entre colaborar ou trair, eles se enfrentavam várias vezes e guardavam na memória o comportamento do outro. Acumulavam pontos. Trair e não ser traído dava o maior número de pontos. Trair e ser traído dava o menor. A colaboração mútua dava um número de pontos razoável, mas não tão tentador como trair e não ser traído. As estratégias apresentadas através de programas de computador tentavam dissimular, fingiam que iam para que o oponente "pensasse que eram confiáveis" e traíam. Deixavam o outro pensar que eram boazinhas e de repente ficavam traidoras, davam uma de João sem braço.
Quem ganhou? quem acumulou mais pontos. Um programa de apenas quatro linhas chamado Tit For Tat. Livremente: olho por olho dente por dente. O quê TFT faz? Ela sempre colabora no primeiro lance e depois repete exatamente o mesmo que o oponente tiver feito em sua jogada anterior.
Repare que ela é simples à beça, ao contrário de outras muito mais sofisticadas, cheias de considerações estatísticas para tentar ganhar o máximo de pontos explorando as demais TFT pode ter sido a estratégia dos genes, pode ter sido a estratégia da seleção natural desde as primeiras moléculas replicadoras até as sociedades primitivas.
"Vamos caçar aquele javali juntos; ajude-me que a gente divide a caça. Nenhum de nós dois conseguirá sozinho, então vamos colaborar por interesse. "Colaboração com base na reciprocidade". Eu coço suas costas você coça as minhas. Se você não atirar eu não atiro. Mas lembre-se. Isso só acontece se houver repetição de encontros. Se eu souber que a interação vai continuar, se eu sei que nunca mais vou te ver o racional é trair.
Exemplo:
Há bilhões e bilhões de bactérias vivendo dentro de nós. Então elas se comportam, pois têm interesse em nossa saúde. Agora suponha que eu me fira e comece a perder sangue. As bactérias "pensam": "o cara vai morrer, a relação vai cabar"; e aí se multiplicam explosivamente como que para tirar partido da fraqueza do organismo que as hospeda. Infecção generalizada. Isso é uma sutil inversão em nossa forma habitual de pensar, mas é válida. A sombra do futuro encurtou, e as bactérias exercitam seu interesse egoísta. É aí que está o drama da guerra fria . Ou eu destruo a Russia numa tacada só ou eles retaliam e destroem NY manhã. Não dá pra correr o risco.
Colaboração existe mas por interesse. Altruísmo não vem naturalmente. Se valorizamos o altruísmo temos que desenhá-lo, criar mecanismos para forçá-lo a acontecer. Sem perspectiva de punição não há colaboração. Deixando as coisas correrem naturalmente... hummm...
Tit for Tat diz: "estou sendo legal com você; não me traia... eu espero reciprocidade da próxima vez"... Esse é o germe da colaboração social. Reciprocidade.
Mas há um grande problema para que uma coletividade chegue a isso.
A Tentação da Trapaça. Lembre-se que a tentação de eu me dar bem sozinho é enorme. A recompensa é maior. Se eu consigo enganar, dissimular, fazer de conta que vou colaborar e trair, acumulo mais pontos que você naquela jogada.
Irã e Iraque poderiam teoricamente fazer um acordo para ganhar rios de dinheiro limitando a produção de petróleo, não fazem porque um teme que o outro traia o acordo.
TFT é a base de um estratégia que a seleção natural pode ter usado para forçar a colaboração de genes egoístas.
10. MAS ESSA ESTRATÉGIA VENCEDORA QUE O COMPUTADOR REVELOU, TIT FOR TAT, PODE EXPLICAR TUDO AOS HUMANOS ?
TFT é encontrada na natureza mas muito menos do que esperaríamos se fosse de fato a estratégia da seleção natural. Sorrimos para estranhos. Damos boas gorgetas a garçons sim, mesmo sabendo que nunca mais vamos encontrar essa gente.
Há uma idéia de que a emoção humana teve origem em nossa necessidade de dar credibilidade ao que dizemos. Genes construíram sistemas nervosos de modo a que nos emocionemos para dar credibilidade às nossas declarações . Algo que automaticamente revele se estamos mentindo ou não, independente do que estejamos dizendo. Ficamos com as faces vermelhas, dizemos emocionadamente "eu te amo". Ficamos com lágrimas nos olhos. Não conseguimos conter as lágrimas. Pedimos perdão.
A natureza desenvolveu mecanismos automáticos para nos possibilitar detectar fraude. TFT não leva em conta que possamos errar involuntariamente. Não adianta pedir perdão, ela retalia na hora porque é cega, não faz julgamentos. Por isso certamente não pode ter sido ela a estratégia preferencial da seleção natural. Era preciso talvez uma outra que soubesse discriminar a trapaça premeditada, do erro involuntário. Daí talvez tenham surgido as manifestações emocionais para permitir essa discriminação.
Veja só a eterna batalha macho fêmea. O que está envolvido nisso?
Esperma e óvulos. Mas esperma é barato. Você gasta tudo e logo está pronto para gastar mais. Óvulos são caros. Se você entrega um óvulo seu para ser fecundado pelo macho errado - um que não vai continuar a relação, não vai ajudar você a cuidar da cria, vai sumir, você corre risco de não propagar seus genes. A cria pode morrer. Você perderá um tempo enorme porque terá de fazer tudo sozinha.
O jogo recorrente então é o seguinte: o macho querendo fecundar o maior número possivel de fêmeas e a fêmea querendo a exclusividade de um certo macho. Lógico: a tentação da trapaça dos dois lados é enorme.
O macho pode prometer mundos e fundos, copular, e se mandar. A fêmea por outro lado pode usar sua arma mais preciosa. A recusa da cópula enquanto não tiver garantias - ou dúvida - que o macho tem se aquela cria que ela carrega é dele mesmo.
E tome de pássaros machos que têm de construir um ninho bacana antes da cópula. Gastam tanto tempo e energia nessa tarefa que isso demonstra à fêmea que suas intenções são as melhores. Outros têm de dançar e se exibir para provar boas condições de saúde; e tome de machos que antes de ejacular dentro da fêmea expelem um líquido que a faz abortar qualquer feto de outro que ela eventualemente carregue.
A fêmea tende a querer todo tipo de garantia do macho. Você é bom em escapar de predadores? Prove. A cauda do pavão. Aquele trambolho enorme nada prático. Sua origem é essa: ele está dizendo à fêmea: pode copular comigo, eu carrego essa cauda desse tamanho e ainda assim os predadores não me pegam. Misture seus genes aos meus. Geraremos crias saudáveis. É o poder de convencimento da propaganda custosa.
A ereção do macho é outro exemplo. Por que esse trabalhosíssimo processo com sangue tendo de ser bomnbeado à alta pressão a fim de produzir um pênis rígido o suficiente para penetrar numa fêmea? Por que não um osso como nos chimpanzés?
Porque ninguém consegue fingir que está com um pênis erecto. Há uma diferença brutal entre um erecto e um flácido. Pênis erecto é sinal de boa saúde, competência para fugir de predadadores, caçar, correr, bons genes.
O jogo que temos de jogar nos leva a ter de arranjar várias maneiras de dizer: jogue comigo eu sou confiável.
Repare esse show de auto promoção por parte de artistas, políticos, esportistas e pessoas públicas em geral, que acontece nos fins de ano. Presentes para favelados, orfanatos pobres e mendigos.
Claro, há sempre um repórter por perto, sempre há alguns fotógrafos de plantão. O político está querendo dizer: sou confiável, continue votando em mim. O cantor: continue comprando meus discos.O jogador de futebol: continue me chamando para fazer comerciais. Sou confiável. Jogue comigo.
11. E ESSE NEGÓCIO DE VÍRUS DA MENTE?
Repare que o jogo da reciprocidade por interesse é algo que se entranhou em nós, pois, certamente houve pressões evolucionárias que eliminaram os genes daqueles que se recusaram a colaborar. Era algo assim como colabore ou morra.
Então temos uma mente que fala, pensa, sente, pergunta, e que ao mesmo tempo, é uma mente programada para colaborar instintivamente, para dar instintivamente provas de confiabilidade.
Nossos ancestrais eram nômades. Viviam andando e percorrendo enormes distâncias atrás de alimento. Volta e meia se viam em contato com outros grupos, para sobreviver podem ter tido de aprender a se conformar, isso é, a fazer o que os outros estavam fazendo. Se todo mundo está fazendo deve ser a regra aqui e eu vou fazer também. Mesmo que eu não saiba porquê.
Há um tipo de pássaro em que são as fêmeas que escolhem o macho. Os machos dançam, rodopiam, fazem acrobacias e elas só olhando. Quando uma escolhe um deles para copular, as outras tendem a imitá-la e os demais ficam chupando o dedo. Um número muito reduzido de machos é responsábvel pela maioria das cópulas nessa espécie.
O que a maioria das fêmeas "pensa" aqui? "Todo mundo está escolhendo esses (pequeno grupo de) machos, eu também vou escolher". Instinto de imitação.
Repare as pegunta que fazemos ao escolher uma roupa: "Estão usando? Está na moda?" Essa pergunta é mais importante do que" é bonito?"
É mais importante estarmos conformados ao grupo. (Note: isso são especulações. Histórias. Hipóteses plausíveis, não são idéiais científicas comprovadas.)
Não seria difícil imaginar um sistema nervoso que vai evoluindo para nos tornar naturalmente conformistas. O homem é um bicho social. Então há um instinto de se deixar infectar por idéias, conceitos, práticas só porque outros estão fazendo isso. Mesmo que não nos façam bem. É aí que surge a idéia de vírus da mente.
O que é um vírus?
É um rabicho de DNA (ou outra molécula semelhante) que quer o mesmo que o gene quer. Replicar-se. Só que o gene escolhe via esperma e óvulos, o vírus escolhe um método traiçoeiro: viaja pelo ar, pela saliva, ou por qualquer meio á sua disposição e entra nas minhas células, fazendo com que elas confundam o DNA deles com os meus. Se apropriam do mecanismo copiador da minhas células e começam a se reproduzir explosivamente.
Em vez de construir um máquina de sobrevivência e se replicar via esperma e óvulos, o vírus segue uma via mais direta se apropriando de um mecanismo replicador já existente (minhas células). É mais prático. Para quê se dar o trabalho de construir uma máquina de sobrevivência se posso parasitar uma já existente? A razão de ser de um vírus é a replicação e nada mais. Se no processo ele me faz doente e causa a minha morte, ele não se importa, porque ele não se importa com nada, desde que ele se replique.
Vírus de computador. Pense. Para quê existe? Para se replicar. Mesmo que ele encha tanto o meu disco rígido que cause pane no meu computador.
Agora, genes e vírus não são os únicos replicadores que existem. Há outros. Em uma palavra a mente, o cérebro é terreno fértil para um certo tipo de hábitos, crenças, conceitos, idéias, práticas a que chamamos memes. Modas, melodias, slogans, coisas que se apropriam de nossas mentes(que são naturalmente imitadoras - lembre-se), exatamente como os vírus se apropriam do mecanismo celular dos organismos vivos, subvertem-nos em seu próprio benefício e tratam de se replicar, se repliacar, se replicar...
Há memes bons. Memes que nos fazem bem. Educação, ciência, música. Memes que têm valor. Há memes indiferentes. Moda por exemplo. O hábito de se usar boné com a aba para trás. Há memes duvidosos: propaganda. Doutrinação ideológica. Há memes maus: Jim Jones, Hitler, seqüêstro de aviões, fanatismo religioso.
Memes usam todo tipo de prática para se perpetuar. Os mais perniciosos são os que embutem na sua formulação uma maneira de se impedir que eles sejam negados. Às vezes através do medo. Exemplo: o meme fogo do inferno incutido numa criança.
O meme diabo. O diabo existe? Claro, e um dos truques dele é fazer-nos achar que ele não existe.
O apelo de marketing básico dessas religiões projetadas especialmente para gente pobre e desasistida: "Não posso pagar à Igreja por que sou pobre". "Mas aí é que sua dádiva tem valor, pois Deus sabe que você está fazendo sacrifício, se não, não valeria nada"
É o princípio da propaganda custosa, o mesmo que explica a cauda do pavão, lembra? Se está gastando tanto é porque realmente deve haver algo de verdade no que se está fazendo.
A mente é presa fácil de parasitas. Parasitas são esquemas mentais que se propagam em benefício deles próprios. Não são idéias que temos, são idéias que nos têm. Idéias, conceitos, sistemas de idéias, ideologias, religiões que dominam as pessoas e se propagam explosivamente, sem mérito intrínseco algum. Pelo simples prazer de se replicar.
13. E A CIÊNCIA TAMBÉM PODE SER CONSIDERADA UM VÍRUS DA MENTE ?
Essa mente que olha para o universo, é uma mente moldada por várias influências que surgiram para ajudá-la a lidar com o mundo no sentido Darwiniano. Gerar crias. Ficar vivo e copular. A inteligência nos deu como sub-produto - produto marginal - a compulsão de querer entender. Era só gene mas a partir de um certo momento ficou gene + cultura, digamos simplificadamente (muito simplificadamente!)
O que nós somos? Somos apenas objeto da manipulção de genes?
O meme chamado ciência nos possibilitou entender o universo num nível muito profundo. É notável. A mente foi capaz de entender até alguns dos mecanismos básicos que produziram a ela propria. Até onde chegaremos?
Nesse sentido somos especias, mas talvez não sejamos tão especiais como gostaríamos de nos ver. Os módulos mentais, os circuitos especializados, que foram sendo gerados para tarefas específicas ao longo do tempo, um dia se "juntaram" e cá estamos nós. Conscientes. Capazes de planejar futuros. Capazes de criá-los. O gene e o meme se complementam e geram a nós.
Essa mente descobre verdades objetivas a partir delas constrói coisas: o antibiótico, a energia nuclear, o laser, as tecnologias digitais, o microchip.
Algo totalmente inédito. No passado, incontáveis vezes asteróides se chocaram com nosso planeta e dizimaram as formas de vida que existiam. A seleção natural atuava em cima de nichos que iam sendo abertos por essas catástrofes naturais.
Agora em Março de 98 surgiu a notícia que um asteróide iria passar a 48.000 km da Terra daqui a vinte e poucos anos. Um Perigo. Se chocasse. Adeus. Não há inevitabilidade nenhuma na presença do homem na Terra: somos fruto do acaso somado a um Glorioso Acidente.
Mas - presa fácil de parasitas - a mente adquire a mania de achar que há resposta e possibilidade de conhecimento objetivo para tudo em todos os níveis. Precisa achar regularidades no mundo. Aí fica vítima da superstição. Quer ver regularidade, sentido e propósito mas ela própria - a mente - é fruto de um processo que não tem nehum sentidio a não ser a replicação - se replicar por se replicar, se replicar...
Presos nas armadilhas dessa mente que mente tome de pirâmides, florais, cristais, bruxas, anjos, demônios, ETs, telecinesias, outras vidas, vibrações cósmicas, etc, etc.
Sem contar o fundamentalismo religioso. O fanatismo ideológico. Vírus .
A mente exige repostas, só que isso não significa que essas respostas tenham de existir. E por que teriam? Só por que eu quero? A mente foi criada pela seleção natural para outras coisas, não para filososfar, mas nós filosofamos assim mesmo.
Até onde poderemos entender? Até onde poderemos fazer a distinção - eu e meu cérebro? Até onde mando eu até onde mandam meus memes? E se a mente é moldada por memes - fisicamente até - quem manda, eu ou meus memes? Isso equivale a perguntar quem sou eu? Quem é essa entidade que faz essa pergunta?
Essa entidade é um produto de genes e memes. Até certo ponto pode saber objetivamente. Onde está ese ponto? Não sabemos, e portanto nossa opção é continuarmos a perguntar, continuarmos a investigar através do melhor processo - do único processo que parte do pressuposto de que a mente não é confiável, que sabe que a mente mente - o processo da ciência.
Para mim o melhor método de se obter respostas é a ciência. É ela que eu recomendo porque é o único modo de se interrogar a natureza que parte do princípio que a mente humana não é confiável. Sabendo que a mente mente, a ciência embute em seu processo um mecanismo automático de eliminação de erros. Os erros engendrados pelos estranhos mecanismos que a mente (esse gloriosos acidentes) usa. Ela mente sem querer. Ela se auto engana, vê ETs, fala com espíritos, comunica-se com mortos, é seqüestrada por extra-terrestres, sente coisas, tem visões, se deixa parasitar por fanatismos, quer acreditar, quer desesperadamente acreditar.
Como a ciência sabe que a mente mente, ela não rejeita a priori nenhuma hipótese. Ela aceita tudo em princípio. Repare o EM PRINCÍPIO. Ao contrário da ideologia, da religião, da crença em verdades reveladas, a ciência aceita, mas pede evidência. Ela não parte de nenhuma autoridade, não acredita em algo só porque que eu "sinto que é verdade". Ela não quer saber se você é mulçulmano, católico, marxista, ela quer saber é da evidência. Ela pega sua idéia e manda você publicá-la para que todos possam se informar sobre seus resultados e tentar reproduzí-los, checá-los. Esse é o processo da ciência. Um processo aberto, sujeito permanentemente ao escrutúnio público. Qualquer um que queira fazer carreira em ciência tem que se expor. Para se obter um Phd você tem de submeter sua tese a uma avaliação pública; a banca examinadora vai ler criticamante o que você tem a dizer. Vai examinar sua tese procurando erros, inconsistências, inexatidões. Esse é o processo. O processo científico faz isso não por masoquismos, mas porque sabe que a mente mente.
Ciência não depende do meu grau de elevação espiritual, não depende se sou bom pai ou não, ciência depende de evidência inquestionável. Einstein foi um péssimo pai, um pésimo marido. Torturava psicologicamente sua primeira mulher, não foi o campeão mundial da doçura e da bondade como a mídia nos vende. Foi também, é verdade, um cara corajoso politicamente, tomou decisões difíceis contra o establishment americano no pós-guerra. Mas nada disso importa para a ciência. Einstein é grande porque suas idéias científicas foram colaboradas pela evidência. Ciência só confia na evidência, na mente não.
14. HÁ ALGUM EXEMPLO RECENTE DESSE PROCESSO DA CIÊNCIA EM AÇÃO?
Repare um exemplo atualíssimo. O tal asteróide que foi dito, iria passar a 48.000 km da Terra lá pelo ano 2028 se não me engano. Um perigo. No passado choques com objetos assim dizimaram a vida na Terra várias vezes. Os dinossauros provavelmente sumiram da Terra por causa dos efeitos de um choque desses na Península de Yucatán no México há 65 milhões de anos atrás.
O cálculo que previa a passagem de um asteróide de 1.6 km tão perto da Terra foi feito por um pesquisador que imediatamente colocou suas observações e cálculos a disposição de outros via Internet, etc. No dia seguinte, muita gente já tinha checado a evidêcia: não era bem 48.000 Km ; tinha havido erro. Era mais ou menos 1milhão de Km. Ufa!
Mas e se fosse um choque frontal? Já aconteceram incontáveis vezes no passado. Agora o conhecimento que a ciência possibilitou nos garante que seria possível interceptar o asteróide antes do choque, destruí-lo via uma explosão ou mesmo fazê-lo mudar de órbita com um empurrãozinho. Poderíamos até mesmo mandar uma sonda-robot para recolher material dele, e nos informar se haveria perigo de estilhaços atingirem a Terra caso o fizéssemos explodir.
A mente dominou a paisagem. Somos os senhores de nossos destinos. Senhores da continuidade da vida na Terra graças ao Glorioso Acidente que nos tornaram inteligentes. Não pedimos isso. Não fizemos nada para merecer isso. Mas aqui estamos.
15. VOCÊ REJEITA ENTÃO TODAS AS COISAS PARANORMAIS ?
De jeito nenhum. Eu apenas - humildemente - não me interesso por elas. Eu só me interesso pelo que a evidência possa respaldar e, nenhuma paranormalidade, por definição, me oferece essa oportunidade.
Meu livro, meu discurso, é um convite. O convite para que se ouça o que a ciência tem a dizer. Ela certamente não responde a tudo o que você possa achar importante, mas aquelas perguntas para as quais ela tem resposta, ela responde como nenhuma outra forma de responder.
Evidência é o fundamento sobre o qual ciência se apóia.
Se você me disser que encontrou um ET no seu quintal, eu acredito logo mas vou querer ir lá fotografar. Vou querer falar com ele. É como o repórter o detetive, se o ET não pode ser detetado por meios sensoriais (os únicos que conheço), se é um ET invisível, que só pode ser visto pelas pessoas com o grau adequado de elevação espiritual, bem esse ET não me interessa. Quem vai definir o grau certo de "elevação espiritual"? O guru? O Papa? Mas a mente deles mente também. Eles tiveram uma revelação especial, diz você. Cadê a evidência pergunto eu? Não tem evidência, você responde, tem que ter fé. E então o que vemos é que estamos pisando em terrenos completamente diferentes e podemos logo chegar a um acordo civilizado sobre a impossibilidade de continuarmos nossa conversa. Não precisamos brigar. Não dá para misturar fé numa verdade revelada com a evidência científica.
Pessoalmente prefiro me engajar na crença fundamentada na evidência. Não me sinto bem ao me subordinar a uma crença supranatural qualquer, contrária a todos os mecanismos que me geraram como pessoa. E por que deveria?
Atos de fé cega - contra toda a evidência - provam, talvez, que sou digno da atenção dos deuses, e mereço seus favores. Já conheço isso: é o princípio da cauda do pavão. Propaganda custosa.
Ciência não depende de personalidades. Não há autoridades nem hierarquia. Einstein mostrou que Newton era incompleto. Ninguém ligou. Ele apresentou evidência. Não houve um movimento dos Newtonianos ofendidos para defender as idéias do mestre. Todo mundo vibrou com o avanço do entendimento, ainda que tenha demorado um pouco para entender e se convencer. Newton também teria vibrado, ele era cientista não tinha nada a defender a não ser a procura daquele tipo de verdade que possa ser desvendada, e essa veradade só se revela pelo acúmulo de evidência a seu favor. Os hereges são plaudidos pelo processo científico, são eles quem fazem o entendimento avançar.
E olha que Newton era pessoalmente bem esotérico. Não deixou porém seu esoterismo influenciar sua ciência. Darwin antes de coletar a evidência de que o "relojoeiro era cego" era um homem religioso, e queria ser pastor Anglicano. A evidência o convenceu que não era necessária uma mente superior para explicar os designs maravilhosos da complexidade organizada das coisas vivas. Ele não deixou seus sentimentos particulares influenciarem sua ciência.
Então ciência exige uma mente aberta. Totalmente limpa de pré-conceitos. É por isso que afirmo que ela pode ser um processo libertador. Pois a produção de ciência de verdade pressupõe ausência total de apego aquilo que possamos "sentir" que é verdade; ao que queiramos acreditar que seja verdade, ou que nos programaram para pensar que é veradade.
O difícil em ciência então é isso. É ficar fiel ao processo dela. O processo é mais importante que o resultado. Cientista de verdade aceita qualquer resultado que tenha sido obtido através do processo. Não há nada em ciência a ser defendido à priori.
A dificulade da ciência não é a matemática, não é a complexidade técnica dos assuntos que ela investiga, não é a dificuldade intrínseca. É a necessidade de uma mente aberta, livre. Isso é que a maior parte de nós não tem. Fomos parasitados. Não nos livramos de preconceitos plantados em nós por processos educacionais ou ideológicos viciantes. Temos bandeiras a defender, temos ideologias pelas quais lutar. O cientista só tem de ter a mente livre. Aceita qualquer hipótese e rejeita também qualquer uma sem a menor cerimônia. É um franco atirador intelectual.
Ciência é sobre liberdade.
16. TODOS OS CIENTISTAS SÃO ASSIM ? CONSCIENTES DO PROCESSO CIENTÍFICO ?
Não. Isso é o ideal do cientista, eu diria. Na prática muitos deles nem sabem que o processo é esse. Mas é. Cientistas são humanos e há muita vaidade e rivalidade entre eles. Há fraude às vezes. O bacana da ciência é que ela se processa independente dos defeitos humanos de seus protagonistas.
Recentemente (1989) dois cientistas da Universidade de Utah anunciaram que tinham reproduzido "a frio", no laboratório, reações de fusão nuclear que ocorrem no Sol. Teria sido revolucionário se fosse verdade. Não era. Ninguém conseguiu reproduzir seus resultados. Eles tinham conduzido seus experimentos em segredo e os anunciaram na imprensa antes que seus colegas pudessem checá-los. Não os publicaram antes para análise e crítica de seus colegas. Mas os caras eram pesquisadores respeitados e vários cientistas de renome deram crédito ao que a imprensa publicou (pelo menos um tinha um prêmio Nobel - a maior distinção que um cientista pode obter). Cientistas freqüentemente são péssimos juízes do processo científico. O que aconteceu nesse episódio - e um dia eu pretendo escrever com detalhes sobre ele - não foi desonestidade ou má fé. Aconteceria com qualquer um trabalhando em isolamento em busca da comprovação de uma idéia fixa. Ninguém poderia fazer um experimento tão complexo sem a crítica e a orientação de outros. Isolamento é a morte da ciência.
17. E DEUS ONDE ENTRA NISSO ? A CRENÇA EM DEUS É INCOMPATÍVEL COM A CIÊNCIA ?
Deus como o designer da complexidade organizada, não é necessário para que nós nos maravilhemos com a natureza. Foi isso o que Darwin mostrou.
Para mim, ficar preocupado com "outras vidas" é uma atitude até arrogante, pois implica na desatenção a ESTA vida. E esquecer esta vida - a única da qual temos evidência - é um pecado capital. Não notar o milagre deslumbrante, arrebatador, que permanentemente se desenrrola diante de nós, para mim é imperdoável.
O Deus relojoeiro é desnecessário depois de Darwin.
Mas muitos cientistas são religiosos. Alguns são ótimos cientistas.Todos aceitam o que Darwin descobriu (se não, não seriam cientistas, seriam ignorantes) portanto a crença numa divindade não é incompatível com a ciência. Aquele sentimento interior, aquela intuição de que tem de haver um principio harmonizador, não é incompatível com a ciência. Einstein mesmo acreditava num tipo de divindade assim, mais associada a uma inteligência cósmica do que a um Deus que dirige cada evento do mundo, perdoa pecados e ouve orações.
Mas houve um momento em que Eisntein quis misturar sua crença pessoal na existência desse deus com sua ciência. Não deu certo. Conto isso no livro.
De qualquer forma a ciência não é incompatível com crença religiosa pessoal. Ela não tem nada a declarar sobre crenças pessoais isso não é de sua conta.
18. O CONFLITO EINSTEIN X FRANKESTEIN TEM A VER COM ISSO ?
Tem . Einstein foi, talvez, o maior físico de todos os tempos. Ele achava - intuía - que tinha de haver uma mente superior, ou melhor, um princípio harmonizador que estaria por trás da ordem cósmica. Esse era o Deus de Einstein. Não era o Deus da religião tradicional.
Essa intuição dele é que o levou a se tornar físico. Ele queria conhecer os segredos desse Deus através dela. O que o tornou famosos em física foi a Teoria da Relatividade, mas logo após seu desenvolvimento outra vertente da Física tomou corpo - a chamada Física Quântica. Einstein nunca gostou dela, pois seus fundamentos contradiziam aquilo que ele achava que uma boa Física deveria desvendar: a mente de Deus, o tal princípio harmonizador. Eisntein tentou "consertar" a tal Física Quântica. Morreu em 1955 sem conseguir.
Frankenstein é a assombração que surge quando nos lançamos à procura dos segredos da mente e do mundo. É uma metáfora que uso para ilustrar o beco sem saída lógico que é a tentativa de se tentar entender causas últimas através de nossa mentes traiçoeiras e mentirosas. Mentes que não foram projetadas para isso. Frankenstein é a criatura se voltando contra o criador.
Para ilustrar: ao dominar os segredos do interior da matéria, a inteligência humana atingiu um novo patamar de entendimento. Ao usar esse entendimento produzimos Hiroshima e Nagasaki e inauguramos a era do terror atômico. Parece que algo queria nos dizer que para cada conquista há uma contrapartida. Novas incertezas nos obrigam a contemplar a limitação de nossa própria condição humana.
Os novos enredos que a ciência cria nos lembram que estamos - graças ao "Glorioso Acidente" - fazendo um gigantesco experimento em que nós mesmos somos as cobaias. Nós só somos responsáveis por nossos destinos.
Podemos, sim, entender. E isso é a glória de Einstein. Mas a cada entendimento novas e insuspeitadas assombrações surgem com os novos enredos que elas definem. Há sempre novos Frankensteins para assombrar Einstein.
19. HÁ REFERÊNCIAS A UMA CERTA PSICOLOGIA EVOLUCIONÁRIA EM SEU LIVRO. O QUE É ISSO ?
O "Glorioso Acidente" trata de aspectos do comportamento humano. Psicologia Evolucionária é a tentativa de entender nosso comportamento e faculdades mentais à luz do processo evolucionário que os moldou. Porque agimos, pensamos e sentimos do jeito que fazemos essas coisas.
O pressuposto é lógico: a mente funciona da forma que funciona por causa da evolução.
Em outras palavras: a mente é o resultado de um sistema de órgãos de computação "projetados" pela seleção natural para resolver problemas enfrentados por nossos antepassados ao longo de sua jornada evolucionária. O que define o que nós somos é o que aconteceu nos últimos 2.5 milhões de anos, quando o cérebro de um certo tipo de chimpanzé mais que triplicou de volume e aparecemos nós, com linguagem, pensamento, consciência, capacidade de planejar o futuro, etc
Por trás de tudo, o nosso conhecido jogo do gene.
Genes que constroem corpos que fazem o que é necessário para serem replicados ver, correr, digerir, copular, são replicados, os que não fazem, não são.
Assim, basicamente, e ao contrário da mensagem religiosa tradicional, a psicologia evolucionária nos convida a olharmos para nós próprios e tentarmos nos entender, não como anjos que decaíram, mas como macacos que se ergueram.
20. COMO É ESSA COISA DA MENTE SER UM CONJUNTO DE ÓRGÃOS DE COMPUTAÇÃO ?
É isso mesmo. O cérebro é visto como um conjunto de módulos - circuitos de computador - que evoluiu independentemente uns dos outros. Evoluiu de modo a gerar comportamentos apropriados às circunstâncias ambientais que iam se apresentando. Por exemplo. Um módulo para enxergar, outro para ouvir, outro para ter desejo sexual. Mais um que ditava comportamentos tipo: achando açúcar, coma! Vendo uma cobra, fuja! Não coma caracassas de bichos mortos há muito tempo.
Módulos específicos para certas coisas de repente ganharam uma unidade, viraram uma espécie de canivete suíço. A mente consciente é o resultado que emergiu dessa integração.
Nós somos o resultado disso.
Nossa miséria e nossa grandeza vem daí. Uma parte da mente é o módulo do desejo sexual por exemplo. Outra é a responsável pelo raciocínio abstrato, o relacionamento entre causas e efeitos. Hoje temos mecanismos contraceptivos que não tínhamos no passado e uma parte da mente então descobre que podemos ter os prazeres do sexo sem necessariamente ter filhos. Essa parte do cérebro não podia ser usada no passado, é típica do homem moderno.
Se os ambientes ancestrais tivessem árvores nas quais nascessem pílulas anticoncepcionais, nós adquiriamos um instinto para evitá-las como quem evita cobras venenosas.
Dito de outro modo:
Nosso corpos e mentes são bons para passar nossos genes para as gerações seguintes. Seleção natural é simplesmente sobre genes se replicando pelas gerações afora. Esse é o primeiro passo. Foi assim que ganhamos cérebros. É por isso que eles são grandes. Mas uma vez que você já esteja de posse desse cerebrão, ele pode ser usado para outras coisas. O computador foi projetado para ser apenas uma super calculadora, mas uma vez que ele estava pronto, sem mudança alguma, usando as estruturas que já estavam lá, nós percebemos que podíamos usá-lo para processar textos, por exemplo.
A Psicologia Evolucionária parte da premissa - muito lógica em minha opinião - de que nossos crânios abrigam uma mente da idade da pedra. Somos uma espécie de Flintstones ao contrário. Eles tinham a aparência de pré-históricos mas suas cabeças eram modernas. Nós temos a aparência de modernos - com nossos carrões e computadores espetaculares - mas nossas cabeças são da idade da pedra.
Nossos ancestrais viviam permanentemente viajando. Montando e desmontando acampamentos. Caçando e colhendo os alimentos que encontravam. Isso durou uns dez milhões de anos. Geração após geração, por dez milhões de anos a seleção natural foi esculpindo lentamente o cérebro humano (a coisa explodiu nos últimos 2.5 milhões de anos, mas já vinha se processando). Favorecendo circuitos competentes - no sentido do "crescei e multiplicai-vos", achar e impressionar parceiros sexuais, caçar, colher plantas não venenosas, identificar as demais, lutar contra predadores, negociar com parceiros, defender-se contra agressão. Os que tinham esses circuitos - os circuitos certos - deixaram mais crias. Nós somos seus descendentes.
Os ambientes em que vivemos hoje nada têm a ver com os que nos deram nosso cérebros e mentes. O computador pessoal tem uns dez anos. A revolução industrial 200. A ciência não tem mais de trezentos. A agricultura tem 10.000 anos.
Nossa mentes não tiveram tempo de sair da idade da pedra e se adaptar - em 10.000 anos à isso tudo.