Sexo
como nossos ancestrais
Por: Isabela Boscov e Marcelo Marthe, Revista Veja, julho 2003
A ciência traz à tona indícios de
que, na hora de escolher um parceiro, ainda somos guiados
pela biologia e por preferências estabelecidas pela espécie
há milhões de anos
Homem alto, forte, caçador habilidoso e dominador.
Mulher jovem, saudável e com potencial para gerar muitos filhos.
Em matéria de sexo, ele só quer saber de engravidar o
maior número possível de parceiras. Ela é mais
seletiva: seu objetivo é engravidar de um macho capaz de lhe
dar a prole mais apta a sobreviver e encontrar um provedor que a ajude
a alimentar e proteger os filhos. Assim eram, nos tempos das cavernas,
os protótipos daquilo que os biólogos chamam de "macho
alfa" e "fêmea alfa", os reprodutores ideais da
espécie. Milhões de anos se passaram desde então,
mas a ciência não pára de trazer à tona indícios
de que o comportamento sexual humano, tal e qual se conhece hoje, segue
fundamentalmente os mesmos mecanismos psicológicos ancestrais.
A herança evolutiva explica, entre outras coisas, por que sexo
e dinheiro – ou melhor, sexo e status – sempre estiveram
intimamente ligados. Nem mesmo uma revolução como a conquista
dos direitos da mulher alterou significativamente as velhas táticas
de sedução e os sinais de atração. A jornalista
americana Candace Bushnell, autora do livro que inspirou a série
Sex and the City, que retrata as expectativas e frustrações
amorosas da mulher moderna, dá seu testemunho a esse respeito
em entrevista nesta edição. "A escassez de machos
alfa está na raiz do fato de que muitas mulheres tendem a ver
suas iguais como inimigas", diz ela. É natural que os ecos
do passado primitivo ainda se imponham. Homens e mulheres, afinal de
contas, passaram apenas 1% de sua trajetória evolutiva sob os
efeitos da civilização. Durante os outros 99%, estiveram
à mercê dos seus instintos – que não têm
nada de simples.
Desde que o naturalista inglês Charles Darwin
publicou A Origem das Espécies, em 59, a ciência se habituou
a analisar a evolução por meio de uma norma cardeal: a
sobrevivência pertence aos mais aptos, e é para sobreviver
no seu habitat que as espécies mudam e se adaptam. Visto sob
esse prisma da seleção natural, o cérebro humano
seria uma máquina de resolver problemas ligados à sobrevivência,
e o sexo não passaria de uma decorrência dessa necessidade.
Mas agora há uma nova revolução em curso na ciência.
Ela prega que, se estamos aqui, é porque cada um de nós
é fruto de uma seqüência ininterrupta, que já
dura milhões de anos, de relacionamentos bem-sucedidos entre
homens e mulheres. Aqueles que sobreviveram saudáveis, mas não
geraram filhos – uma escolha que o homem, como animal inteligente,
está habilitado a fazer –, não estão representados
entre nós. A meta da evolução, então, não
é outra que não a procriação. E, se procriar
é sumamente importante, é de supor que as estratégias
que as espécies desenvolvem para transmitir seus genes têm
de ocupar o lugar central nas disciplinas que analisam a evolução.
É exatamente isso que vem ocorrendo há cerca de duas décadas.
Nunca os cientistas pensaram tanto em sexo – e o que eles estão
descobrindo é que, nisso, acabam de se juntar ao resto da humanidade,
e de toda a vida sobre o planeta. Todos nós só pensamos
naquilo – e já há pesquisadores que propõem
que o cérebro humano é, na verdade, uma máquina
de cortejar. Mais: ele é o maior e o melhor ornamento sexual
da espécie humana, assim como a cauda o é para o pavão
e os chifres, para o cervo.
Vejamos: você se senta ao lado de um belo representante
do sexo oposto no avião e imagina que nada faria aquelas dez
horas de vôo passar mais rápido do que, digamos, uma boa
conversa. Aí já está o primeiro diferencial entre
o ser humano e, por exemplo, o pavão. Simplesmente mostrar a
cauda e partir para o ataque é coisa que costuma resultar em
visita à delegacia – e, alguns milhares (ou milhões)
de anos atrás, renderia um sensacional corretivo por parte dos
familiares encarregados de proteger o objeto de desejo. Ou seja, é
preciso se fazer tão atraente quanto o parceiro pretendido, para
que ele concorde em entrar no jogo. Os requisitos são extensos:
assunto, senso de humor, bons modos, charme e percepção,
para não continuar falando como uma matraca quando a pessoa do
assento ao lado dá mostras de que gostaria de tirar uma soneca
reparadora. A boa aparência ajuda, e muito, mas não é
decisiva. De nada adianta um homem ter um maxilar forte – um dos
traços mais valorizados pelas mulheres desde tempos imemoriais
– se ele mantém seu interior à vista enquanto se
serve do jantar. Homens e mulheres são guiados em grande parte
pelos apelos biológicos. Mas, como a evolução colocou
a espécie na situação peculiar de incluir a inteligência
nessa equação, os chamados genéticos vêm
se misturando, desde tempos ancestrais, ao que se convencionou chamar
de cultura.
Alguns estudiosos da linha de frente da psicologia
evolutiva, como o americano Geoffrey Miller, acham que é aí
mesmo, aliás, que está a razão de tudo aquilo que
os teóricos da evolução nunca conseguiram justificar,
como a arte, a música, o refinamento da linguagem, a moral ou
a política. Nenhuma dessas atividades serve para melhor sobreviver
à seleção natural. Até há pouco,
elas eram explicadas como subprodutos de um cérebro que tivera
de se desenvolver extraordinariamente para se adaptar ao ambiente. Mas
se essas habilidades humanas existem, e perduram, e ficam cada vez mais
elaboradas, é porque elas têm alguma função
biológica direta – ou a evolução já
teria cuidado de se livrar desse excesso de bagagem. Mas qual função?
Resposta: elas são táticas de seleção sexual
e conquista. Ou seja: se somos o que somos, diz Miller, é para
melhor nos acasalarmos. Para homens e mulheres, isso significa combinar
seus genes ao que houver de melhor à disposição
no mercado. Para as mulheres, mais do que para os homens, significa
também que é preciso achar um modo de que a prole sobreviva
até o ponto de passar essa combinação privilegiada
adiante. Para ambos, esses impulsos mesclam biologia, comportamentos
e sentimentos num tal grau que é quase impossível distinguir
onde uma coisa termina e a outra começa.
Para se ter uma idéia da complexidade do ser
humano, um dos grandes estudiosos da área, o canadense Steven
Pinker, elucida um ponto. Na maioria das espécies, o desejo sexual
é uma estratégia para propagar os genes. Entre homens
e mulheres, não. Entre nós, o desejo sexual é uma
estratégia para obter prazer sexual – e esse prazer é
que é a estratégia dos genes para se autopropagar. O prazer
é tão decisivo para a espécie humana que hoje se
credita a ele o fato de os homens terem, proporcionalmente, o maior
pênis entre os primatas. Se o objetivo fosse simplesmente introduzir
o máximo de sêmen na fêmea, como acontece entre os
nossos parentes mais próximos, o importante seria ter grande
volume testicular, e um órgão sexual apenas funcional.
Mas as mulheres parecem ter, desde sempre, apreciado o estímulo
tátil que um órgão maior é capaz de proporcionar
(ainda que a cartilha do politicamente correto hoje mande dizer que
tamanho não tem nada a ver com documento). E, como são
as mulheres que estão ao volante da seleção sexual
– porque elas precisam ser seletivas –, os homens acabaram
por adquirir a aparência que têm, sem maior função
biológica além de cativar as emoções de
suas parceiras. Pode ser essa também – a implacável
seleção sexual exercida pelas mulheres – a razão
para o que alguns estudos vêm revelando: que os homens considerados
bonitos costumam ter sêmen mais saudável do que o de seus
colegas esteticamente menos favorecidos.
Isso quer dizer que uma questão tão polêmica
nos dias atuais – a da ditadura da beleza – tem origens
bem anteriores à indústria da moda. Ainda que os padrões
de beleza variem conforme a cultura e a época, eles obedecem
a algumas constantes. Primeiro, os sinais de diferenciação
sexual. Os homens apreciam nas mulheres os lábios mais cheios,
a cintura fina e os seios, enquanto as mulheres valorizam a voz grossa,
o queixo forte, a musculatura. Outra constante é a simetria,
que hoje se sabe ser um sinal clássico de saúde genética,
reconhecido como tal pela maioria das espécies. O ser humano
está tão programado para captar esses sinais que simplesmente
observar um rosto belo desencadeia reações intensas de
prazer. A área cerebral ativada é, curiosamente, a mesma
que dá aos viciados em drogas ou em apostas aquele frisson no
momento em que eles se entregam ao seu hábito. E ela calha de
ser também uma das áreas mais antigas do cérebro,
formada em tempos que precedem em muito o surgimento da linguagem. Os
feios e as feias, assim, que perdoem a evolução: a beleza
é mesmo um vício humano, cultivado durante milhões
de anos.
Ainda que muitas das preferências ditadas pela
seleção sexual já não tenham razão
de ser hoje em dia, quando a vida é muito menos brutal do que
no tempo das cavernas, elas estão tão arraigadas no cérebro
humano que continuam a ditar comportamentos. Veja-se, por exemplo, o
caso da altura. É um fato estatisticamente comprovado que as
mulheres preferem homens mais altos do que elas. Nos primórdios
da humanidade, os motivos para tal eram claros: se um homem podia investir
tanta energia nutricional na sua altura, ele tinha saúde para
dar e vender – e seus genes, portanto, eram desejáveis.
A altura seria, assim, não só uma vantagem em termos de
força física, mas também um adorno sexual. Esse
raciocínio parece ir frontalmente contra o caso típico,
nos dias de hoje, do empresário poderoso, e não muito
alto, que se cerca de mulheres com vários palmos de vantagem
sobre ele. Para alguns estudiosos, não há aí nenhuma
contradição, e sim uma resposta direta aos ditames da
biologia. Com sua escolha de parceiras, esse homem estaria propagandeando
que o que lhe falta em altura lhe sobra em capacidade como provedor
– e, portanto, como difusor de seus genes.
As feministas costumam se arrepiar com essa idéia,
mas, pelo menos do ponto de vista da evolução, a igualdade
é uma quimera, e não só por causa do descompasso
entre o relógio biológico do homem e o da mulher. Hoje
os pesquisadores sabem que também os cérebros masculino
e feminino não funcionam de modo idêntico. Desde o berço,
os meninos tendem, grosso modo, a ser "sistematizadores",
enquanto as meninas são, em geral, "comunicadoras":
eles resolvem problemas com mais eficiência, elas avançam
mais na linguagem. Mesmo na vida adulta, quando a educação,
a cultura e a vida em sociedade já cuidaram de igualar a maioria
das habilidades entre os sexos, certas diferenças continuam marcantes.
Qualquer casal já passou algum dia por uma discussão em
que ela remói como ele a magoou naquele dia de outubro de 1991,
e ele jura não ter a menor recordação do episódio.
Vários estudos indicam que nenhum dos dois está mentindo.
Imagens feitas em ressonância magnética do cérebro
de homens e mulheres no momento em que eles estão sendo submetidos
a uma mesma experiência emocional intensa mostram um cenário
contrastante: enquanto apenas certas áreas do cérebro
masculino se acendem, o delas vira uma árvore de Natal. A quantidade,
e o tipo, dos circuitos ativados pela emoção é
o que explica o fato de eles não tardarem a esquecer os sentimentos
provocados pela experiência, enquanto os delas permanecem nitidamente
impressos na memória – e prontos a causar muitas desavenças
conjugais pelas décadas vindouras.
Outro traço que as mulheres têm de forma
muito mais acentuada que qualquer outro primata é a ovulação
oculta – os homens, e quase sempre as próprias mulheres,
não sabem quando elas estão férteis. Trata-se de
um truque que ofereceu a elas, e à espécie em geral, uma
série de vantagens evolutivas. O intrigante é que essas
vantagens foram mudando de figura no decorrer do tempo. Os machos de
muitas espécies matam os filhotes gerados por outros machos para
tirar a fêmea da lactação, fecundá-la de
novo e garantir que os seus genes, e não os do concorrente, passem
adiante. Especula-se que, nos primórdios da humanidade, não
tenha sido diferente. Mas, se a fêmea é capaz de ocultar
sua ovulação, fica difícil dizer quem é
o verdadeiro pai da criança – e eliminar a cria deixa de
ser uma opção. À medida que o homem foi se tornando
um animal social e politicamente organizado, entretanto, a ovulação
oculta começou a atender a outro propósito: o de manter
o parceiro interessado. Já que ele não sabe se seu chute
foi a gol, é preciso insistir no treino.
Como, no ser humano, biologia e cultura sempre andam
juntas, começam a surgir evidências de que hoje as mulheres
tiram dessa característica outra vantagem ainda: a de pular a
cerca sem dar na vista. Desde que as peculiaridades do ciclo menstrual
foram destrinchadas, no século XX, elas podem saber quando estão
ovulando – mas não precisam contar a ninguém. E
há mesmo provas de que elas olham muito mais para os lados durante
o período fértil – e que os homens reagem mostrando-se
muito mais atenciosos nessa fase do mês do que em qualquer outra.
Pesquisadores da Universidade do Novo México, nos Estados Unidos,
se deram ao trabalho de medir a incidência com que os maridos
dão buquês de flores, fazem telefonemas inesperados e convidam
para jantares românticos, e descobriram que esses mimos coincidem
maciçamente com o período fértil das esposas. Ou
seja, ambos estão atendendo a desejos ancestrais: elas, o de
procurar sempre os melhores genes para combinar aos seus, e eles, o
de vigiar a sua fêmea – mas com táticas que empregam
todos os benefícios da civilização.
Em sua busca ancestral pelo melhor material genético,
as mulheres não raro pulam a cerca de fato. Estudos feitos nos
Estados Unidos indicam que em média 10% das crianças não
são filhos biológicos dos maridos de suas mães,
e sim fruto de escapulidas conjugais. Em outra pesquisa recente, realizada
por dois cientistas americanos com um universo de 349 pessoas casadas
de ambos os sexos, nada menos que 34% das entrevistadas tinham fantasias
sexuais freqüentes com outros homens. Sejam casadas ou solteiras,
no entanto, as mulheres não chegam nem perto da performance dos
homens quando o assunto é variação de parceiros.
Embora elas costumem ser evasivas sobre o assunto mesmo em pesquisas,
as estatísticas sugerem que os homens têm pelo menos três
vezes mais relações fortuitas – o tal sexo casual.
Garotas liberadas como as da série Sex and the City podem até
existir em maior número do que antigamente, mas ainda são
uma exceção à regra. "As mulheres que praticam
sexo casual sempre foram minoria e, mesmo com a liberação
feminina, continuam a ser um fenômeno restrito aos grandes centros
urbanos, onde podem ter relações anônimas sem ferir
sua reputação", disse a VEJA o evolucionista David
Buss, autor de um estudo fundamental sobre a psicologia do sexo, intitulado
A Evolução do Desejo.
A voracidade sexual masculina é reflexo da velha
meta biológica de fecundar o maior número possível
de parceiras. No meio científico, ganhou o nome de efeito Coolidge,
em referência ao ex-presidente americano Calvin Coolidge (1872-1933).
Certa vez, ele e sua mulher visitaram, separadamente, uma fazenda. Ao
saber que um galo copulava dúzias de vezes ao dia, a primeira-dama
se impressionou. "Contem isso ao presidente", pediu ela aos
assessores. Mais tarde, ao ser informado, Coolidge também ficou
curioso – mas a respeito das parceiras do galo. Descobriu que
eram sempre frangas diferentes. "Contem isso para minha mulher",
devolveu ele. Os machos de muitas espécies não medem esforços
ou riscos em seu apetite por novas conquistas amorosas. Num certo tipo
de sapo, os indivíduos são tão rápidos no
gatilho que às vezes, por engano, investem sobre rivais do mesmo
sexo – que emitem um ruído de alarme para avisar sobre
o equívoco. O homem da idade da pedra também era insaciável:
há evidências arqueológicas de que era comum que
ele tivesse até dez mulheres.
Para os cientistas, o fato de os machos humanos serem
15% maiores que as fêmeas é um indicativo de que havia
competição violenta entre eles pela posse delas. Enquanto
os vencedores conseguiam propagar seus genes à vontade, aos perdedores
restava se aproveitar dos vacilos dos rivais – quando estes partiam
para uma longa caçada, por exemplo –, para ter acesso às
mulheres. Uma estratégia adotada pelos machos de algumas espécies
de animais permanece até hoje em voga entre os homens: se ele
não é o líder do pedaço, pode tirar bom
proveito da amizade com o maioral. Veja-se, por exemplo, o que pesquisadores
descobriram sobre uma espécie australiana de pássaro.
Os machos menos vistosos não desgrudam daqueles que são
mais coloridos e apreciados pelas fêmeas. Ficam sempre por perto,
cooperam com o casal – e, quando o titular menos espera, fecundam
a fêmea. Entre os homens, os amigos também podem ser rivais
traiçoeiros. Segundo David Buss, os companheiros mais íntimos
de um homem são aqueles que têm mais condições
de vir a traí-lo – sob o manto da fraternidade, podem acalentar
desejos inconfessáveis pela namorada alheia e, com sorte, até
concretizá-los. A evolução forneceu aos machos
humanos, ainda, uma característica psicológica que as
mulheres detestam: eles são capazes de se apaixonar loucamente
e fazer as maiores juras de amor – para logo se desinteressarem
da parceira. E ambos os sexos aprenderam que uma boa intriga pode ser
uma arma valiosa para desancar eventuais concorrentes. Pesquisadores
da Universidade do Texas fizeram um estudo para saber até que
ponto as pessoas são capazes de se valer da maledicência
para fisgar um parceiro alheio. Nada menos que 60% dos homens e 53%
das mulheres responderam que já haviam tentado sabotar alguma
relação – e disseram-se bem-sucedidos em um terço
dessas tentativas.
A psicologia evolutiva mostra que o modo de pensar
dos homens muda radicalmente quando eles estão à procura
de uma parceira fixa. Quando isso acontece, eles revelam-se tão
seletivos quanto as mulheres, pois estão fazendo aquilo que os
cientistas chamam de "alto investimento parental" numa futura
prole – quer dizer, abdicam da estratégia de propagar seus
genes com o maior número de fêmeas possível e passam
a apostar suas fichas numa eleita. Nessa hora, eles podem até
enumerar inteligência, simpatia e companheirismo como atributos
desejáveis numa mulher. Mas a herança ancestral faz com
que procurem, acima de tudo, outras qualidades: beleza e juventude.
Eis um exemplo brasileiro: na agência de relacionamentos virtual
Comovai, que possui um cadastro de mais de 350.000 clientes, a maioria
dos candidatos ao altar é composta de quarentões à
procura de mulheres na faixa dos 20 aos 30 anos. "Os homens não
querem mesmo saber das feias e das mais velhas. É muito triste",
diz a psicóloga Marly Kotujansky, sócia da agência.
A ciência vem demonstrando que, ao embarcar num
casamento, os homens sofrem uma notável alteração
biológica. No ano passado, pesquisadores da Universidade Harvard
compararam os níveis de testosterona de solteirões e de
maridos que dedicam boa parte de seu tempo à família.
É esse hormônio que regula, entre outras coisas, o apetite
sexual e a agressividade dos homens. Verificou-se que a quantidade de
testosterona no organismo dos casados tende a ser menor do que naqueles
indivíduos que estão livres, leves e soltos no mercado
da azaração. Ou seja: não é à toa
que muitos se tornam mais pacatos depois do casamento, transferindo
a energia que gastariam na corte às fêmeas para tarefas
como levar as crianças ao shopping e passear com o poodle da
família.
Qualquer homem ou mulher à procura de um parceiro
sabe, por experiência e intuição, que o tipo de
social-darwinismo descrito por Candace Bushnell continua vivo e operante
no território romântico. O biólogo Kevin J. McGraw,
da Universidade Cornell, nos Estados Unidos, achou que seria possível
traduzir a competição em números. McGraw examinou
milhares de classificados pessoais publicados por mulheres em jornais
de 23 cidades americanas, e chegou a conclusões no mínimo
curiosas. Nas cidades maiores, onde há grande disputa pelos "recursos
naturais" – emprego, residência, dinheiro –,
os requisitos mais comuns são que o candidato seja "financeiramente
estável", ou "profissional e inteligente". Nas
menores, onde os confortos do dia-a-dia são mais acessíveis,
as mulheres tendem a enfatizar, em seus anúncios, as qualidades
morais e sentimentais da alma gêmea que gostariam de encontrar.
O mais intrigante na espécie humana é
que a quantidade de semelhanças entre os sexos supera em muito
a quantidade de diferenças. Nas outras espécies não
é assim. Pavões machos têm cauda longa, colorida
e ornamentada, enquanto suas fêmeas são arrematadas por
umas poucas peninhas sem graça. Cervos machos ostentam galhadas
impressionantes, mas, na maioria das espécies, suas fêmeas
não têm chifres. Já homens e mulheres compartilham
todos os seus "adornos sexuais" – seu gosto pelo esporte,
pela arte, pela linguagem e pelo poder. Isso nos torna realmente uma
espécie única. A pavoa não precisa ter uma cauda
bela para apreciar a dos machos à sua volta. Mas uma mulher tem
de dominar os refinamentos da linguagem para entender que um homem que
usa melhor as palavras lhe está fazendo uma corte mais elaborada
que a do pretendente que não sabe juntar o sujeito ao predicado.
Um homem tem de ter algum senso estético para, naquela visita
à galeria de arte com a namorada, não dizer que a pintura
que ela tanto apreciou parece ter sido feita por uma criança
de 5 anos. Quando homens e mulheres produzem e assimilam cultura, pode-se
dizer que estão refinando suas estratégias de sedução,
ainda que nem lhes ocorra que é isso que estão fazendo,
e que os benefícios são muito mais amplos do que o sucesso
com o sexo oposto. Em suma: homens e mulheres têm de se aprimorar
sempre, e no mesmo passo, para serem capazes de julgar os méritos
uns dos outros e atribuir-lhes o devido valor. A seleção
sexual pode ser o mais antigo e primitivo de nossos instintos. Mas é
ela que nos faz civilizados.